P. CURZIO NITOGLIA: O PRÍNCIPE CRISTÃO CONTRA O PRÍNCIPE DE MAQUIÁVEL

 

 

PADRE CURZIO NITOGLIATradução de Gederson Falcometa

20 abril 2010

http://www.doncurzionitoglia.com/Principe_Cristiano_Vs_Principe_Machiavelli.htm

Introdução

Maquiável, depois de Dante e mais que Dante, nega a ordem política indicada por S. Tomás no De regimine principum. O Aquinate quis reunir a Sociedade a Deus, Maquiável queria uma política autônoma da moral e de Deus. O príncipe de Maquiável é o oposto per diametrum ao príncipe de S. Tomás, e produzirá a separação entre política e ética, entre Estado e Igreja. Se para S. Tomás a sociedade deve ser ordenada a Deus por aqueles que governam para Maquiável o que conta não é o fim último, mas o interesse egoísta do príncipe. Segundo Maquiável, seguido por Nietzche e os neo-pagãos, o cristianismo fez os romanos covardes e vis, fazendo o Império entrar em colapso; será tarefa de Ribadeneyra, Belarmino e Vieira, refutá-los e demonstrar que os cristãos, naquilo que diz respeito a sua vida privada, precisam ser humildes e mansos; mas quando é preciso defender a fé e a pátria tornam-se corajosíssimos, e a história do I século d.C. até o século XX amplamente o demonstra. Maquiável – como já vimos – é cínico, ímpio, acristão, pagão; para ele a religião pode ser boa somente se serve os interesses do príncipe “volpe e leão”; os três jesuítas que citei mostram que a política, como ética social, é toda contrária daquela maquiavélica, que então é a moderna e a atual, com todos os maus exemplos que temos debaixo dos olhos, a nível político e também eclesial.

 

 

(1a parte)

A) RIBADENEYRA

Segundo Ribadeneyra os políticos maquiavélicos tem um único desejo: destruir o reino social de Cristo e fazer reinar o princípe egoísta, despótico e tirano. O tratado do jesuíta espanhol é dividido em duas partes: a primeira indica a relação que o príncipe deve ter com a religião; a segunda trata da arte política de conduzir a sociedade. “Em definitivo nos encontramos diante de um tratado de ciência política católica, organizado em torno da fé presente na Contra-reforma e feita apaixonante pela carga polêmica do jesuitismo hispânico ([1]). Os autores escolásticos afirmam que nenhum homem é bom político por direito natural, mas só porque tem determinada qualidade ou virtude. S. Tomás ensina: “Só a ciência e a virtude e outras prerrogativas do gênero tornam uma pessoa idônea a exercitar a autoridade” (S. T., II-II, q. 102, a. 1, ad 2um). O politico, além da ciência deve possuir a virtude, contrariamente a quanto ensinava Maquiável, na verdade é impossível que um homem, sem prudência, justiça, fortaleza e temperança, possa promover o bem comum da Sociedade. É quanto nos explicará os três jesuítas, citados neste capítulo.

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● Pedro De Ribadeneyra, O príncipe cristão

1º livro

‘o valor da religião e a veneração a Deus

que deve ter o príncipe cristão para governar bem’

Ribadeneyra, no primeiro capítulo do primeiro livro, se defende atacando: “a diferença que existe entre os políticos modernos e nós é que os primeiros querem que o príncipe tenha por boa, a religião dos próprios súditos, qualquer que essa seja, verdadeira ou falsa, enquanto nós queremos que esses saibam que a religião católica é a única verdadeira, e só ela se pode defender. Eles querem que os príncipes se sirvam da religião como pretexto, para enganar e distrair o povo, (…) nós queremos, ao invés, que os príncipes sirvam verdadeiramente a verdadeira religião” ([2]). No segundo capítulo afirma que os maus príncipes se servem da religião para enganar melhor. No quinto ensina que se os romanos antigos deram muita importância a sua falsa religião pagã, com maior razão nós cristãos devemos ser mais zelantes pela nossa Religião para a conversão do Estado cristão. No sétimo nos explica aquilo que a religião cristã ensina sobre o dever dos príncipes para conservar o seu Estado: temer Deus, observar os seus mandamentos, não ensoberbecerem pelo comando. No décimo afirma que a Providência é mais solícita para o rei bom. “Coisa não fará Deus ao rei que o serve, de forma que os seus súditos, O reverenciem, extirpem os vícios e propaguem as virtudes, em seus reinos?” ([3]). No décimo primeiro capítulo nos indica qual é a verdadeira felicidade do rei. Essa consiste no prêmio final: o Céu e a salvação da alma. No décimo quarto demonstra que os príncipes que seguem a razão de Estado arruínam os seus reinos.

De fato, Santo Tomás ensina que a sabedoria e a potência são irmãs da verdadeira religião; que o chefe o qual guarda mais a razão de Estado que a lei de Deus perderá seguramente o seu Estado. No décimo sétimo capítulo adverte o príncipe cristão a proteger a religião professada pelos próprios súditos. “A primeira preocupação dos príncipes cristãos deve ser aquela da religião. Enquanto a falsa razão de Estado dos políticos (…) é ímpia, diabólica (…) destruidora do próprio Estado (…). A razão de Estado ensina que os príncipes não devem ocupar-se da religião de seus súditos, mas deixa que cada um siga a religião que quer (…) como faziam os pagão que toleravam as seitas filosóficas e aprovavam todas as religiões” ([4]). Enquanto, segundo Ribadeneyra, o príncipe cristão nos seus Estados, não deve tolerar os heréticos ou sectários, porque se em um mesmo Estado se encontram os católicos e os heréticos, nele nascerá um grande turbamento e talvez uma sedição. A tarefa do principal do rei é aquela de proteger a religião católica e não permitir a liberdade de religião. No décimo nono capítulo explica que os reis devem favorecer a religião e não serem juízes de coisas religiosas. “Esses são os custodes da lei de Deus, não os intérpretes. São ministros da Igreja e não juízes; são armados para castigar o herético (…) mas não são os legisladores e os intérpretes da vontade divina nas coisas eclesiásticas (…), Se encontra qualquer grave dificuldade deve recorrer ao sacerdote” ([5]). No vigésimo explica que os hereges devem ser punidos e que a liberdade de consciência é perigosa. “A verdade é que os infiéis (…) não devem ser constritos a abraçar a fé, porque ela é uma coisa livre e é um dom de Deus. (…) Mas os hereges e aqueles que são batizados (…) podem e devem ser obrigados a respeitá-la mediante penas, e castigados severamente, se não o fazem (…). Daqui os Santos deduzem que se devem matar como lobos, para que não morram as ovelhas…” ([16]). No vigésimo sétimo assinala que as heresias são a causa das revoluções e da ruína dos Estados. “Como a lei de Deus nos ensina a obedecer aos nossos reis, nas coisas que não são contrárias a essa, assim aqueles que obedecem a Deus, necessariamente obedecerão ao príncipe (…). Enquanto o homem quando se destaca por causa da heresia, perde o santo jugo e a submissão que deve a Deus e é similar a um cavalo sem freio, e negligência também a obediência ao seu rei (…). Aquele que trai o próprio Deus trai também o seu príncipe (…). Então da deslealdade e da desobediência, nascem as rebeliões contra os príncipes, as revoltas e as divisões dos reinos, o incêndio e a devastação dos Estados” ([7]). No trigésimo explica como os príncipes que incorrem em qualquer pecado grave sejam punidos pela Igreja. “A mesma religião ensina aos grandes príncipes que se por vezes, como homens, caem em qualquer grave delito, sejam prontos a reconhecê-lo, se humilhem e se sujeitem aos cânones eclesiásticos, a censura e a correção da Igreja” ([8]).

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2º livro

“o aspecto politíco da condução do reino:

as verdadeiras virtudes que são próprias do rei”

No primeiro capítulo do segundo livro, Padre Ribadeneyra afirma que para falar das virtudes necessárias para bem governar, precisa primeiro explicar a diferença entre o conceito cristão e aquele pagão de virtude. Entre o cristão e o pagão existe uma diversa concepção da moral individual e social. Os pagãos podem chegar a conceber o fim último só graças a razão natural, então aquela que esses acreditam virtudes os conduzem só a um fim natural (bem estar temporal). Ao invés o cristianismo, iluminado pela fé e pela Revelação, conhece também o fim sobrenatural do homem, a Visão Beatífica, para a qual nos conduz a verdadeira e perfeita virtude. A filosofia tomista ou cristã procede só mediante a razão natural, mas não prescinde das respostas, que a essa vem da Revelação, que a guia só extrinsecamente e negativamente, mas realmente; portanto a política de Aristóteles é imperfeita a respeito daquela de Santo Tomás o qual, além da luz da razão humana, poderia recorrer, extrinsecamente, a luz da teologia e da Revelação divina ([9]). Por exemplo, como quando é necessário resolver um problema matemático e o manual nos dá só a solução; o estudante procederá baseando-se só sobre matemática na solução do problema, sem porém desprezar a ajuda extrínseca ou a solução do problema ofertada-lhe pelo livro, e se ao fim de sua busca a sua solução não corresponde àquela do livro, deverá pacientemente recomeçar e ver onde errou para corrigir-se e resolver justamente o problema. Então o cristão não pode considerar verdadeira e perfeita a virtude do pagão que é privada de todo referimento a ordem sobrenatural; portanto sem a religião cristã não é possível a perfeita virtude; isto não excluí que certos cristãos vivam pior que certos pagãos. As virtudes naturais pagãs não são más em si, contra o erro de Bajo, mas são imperfeitas, porque falta a elas referência a ordem sobrenatural; elas podem ser aperfeiçoadas só pelo cristianismo, que tem a verdadeira noção de Deus sub ratione Deitatis e do fim último que é sobrenatural na sua essência e dos meios ou virtudes que necessitam para alcança-lo, os quais devem ser eles também sobrenaturais, que é proporcionada ao fim último sobrenatural. Padre Royo Marin, escreve que:

 

a) As virtudes naturais adquiridas do pagão

podem subsistir sem a graça santificante. Se adquirida mediante a repetição de atos, sobre a direção da razão natural. O seu objeto ou fim é acessível a razão natural. As virtudes adquiridas para serem mais estáveis, devem ser conexas entre elas e bem endereçadas para o fim último natural.

 

b) As virtudes infusas sobrenaturais dos cristãos

não subsistem sem a graça santificante. São infusas por Deus. O seu objeto é sobrenatural e proporcionado ao fim sobrenatural, são subordinadas as virtudes teologais e ao fim último sobrenatural. A graça habitual é acompanhada do ‘cortejo de virtudes e de Dons do Espírito Santo’. Ora os meios devem ser proporcionais ao fim. E as virtudes teologais nos ordenam ao fim último sobrenatural ([10]). Ocorre também distinguir o paganismo-religião (idolátrico e politeístico), de uma certa sã (ainda que imperfeita) filosofia greco-romana, que com Platão-Aristóteles (na Grécia), Cícero-Sêneca (em Roma) cultivaram aquilo que são as linhas fundamentais da verdade sobre o ser, a consciência e a ética natural.

 

Verdadeira natureza do paganismo-religião

Padre de Ribadaneyra S.J., retoma, asserindo que “os pagãos não possuíam um verdadeiro sentido de virtude, porque a submetiam a idolatria, (…) que obscura o intelecto, extravia a vontade e perverte todas as capacidades do homem. As suas ações miravam a fins particulares e mundanos, como as honras, a glória, a fama terrena e é mirando isto que  – como disse S. Agostinho – os romanos venceram as paixões desordenadas do homem (…) e também São Gregório Nazianzeno afirma que os pagãos “embora perseguindo coisas boas, não agiram com pureza de intenção, porque mais do que qualquer coisa movia-lhes o desejo da glória, ao invés do amor pelo próprio bem” ([11]). O homem pagão cego e obcecado – escreve Bossuet – não quis adorar Deus mas os ídolos que ele próprio havia criado. « A idolatria nascia do apego profundo e desordenado que temos por nós mesmos. Nós homens inventamos os deuses que eram similares a nós, sujeitos as nossas mesmas paixões, fraquezas e vícios, de modo que adorando estes deuses, os pagãos adoravam a si mesmos » ([12]).

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Tornemos agora ao livro de Ribadeneyra; no segundo capítulo, o jesuíta espanhol, demonstra que as virtudes do príncipe cristão devem ser verdadeiras e não afetadas ou simuladas, como aquelas dos fariseus e do príncipe neo-pagão de Maquiável; o qual ensina uma “doutrina falsa, ímpia e indigna não só de um cristão, mas de todo homem reto e prudente. Ele afirma (…) que para melhor enganar e conservar os seus estados, o príncipe deve fingir-se temente a Deus, embora não o sendo, (…) e assumir ver por outra a mascara da virtude que lhe parecer mais oportuna, para conseguir o próprio lucro, dissimular os seus vícios e ser estimado, isto que em realidade não é religião (…) As palavras de Maquiavel saíram do inferno, para destruir a religião e rasgar do peito do príncipe cristão com um só golpe todas as virtudes. (…) Maquiável afirma que muitas vezes o príncipe será obrigado a agir contra a fé, a caridade, a humanidade e a religião para conservar o seu Estado, (…) mas o Estado sem virtude não pode ser mantido de modo nenhum  (…). A simulação não pode durar muito tempo, e quando é desmascarada o príncipe é tanto mais odiado quanto mais se compreende que quer enganar. Porém a conservação dos Estados não depende (…) dos homens (…). Aquilo que sobretudo conta é a vontade do Senhor, o qual lhes dá os Estados e lhes conserva ou lhes transfere a seu gosto. E o príncipe pode ganhar o favor de Deus (…) apenas respeitando a santa lei (…). Não é fim da religião conservar o Estado, mas sim é o Estado que deve servir a essa” ([13]). No terceiro capítulo o jesuíta espanhol ensina que o príncipe hipócrita é odiado por Deus. De fato segundo Maquiável o seu príncipe deve dar a Deus as folhas e ao demônio os frutos. Como se o Senhor do Universo, fosse um ídolo de pedra que não sabe, nem vê e não recompensa o mal e o bem. No quinto trata da justiça do príncipe cristão, deixando de lado Maquiável e companhia. Justiça é dar a qualquer um, o seu e sobre ela se funda o reino, sem essa ele se perde. No sexto escreve sobre a distribuição das honras; na verdade o príncipe cristão deve fundar-se sobre a justiça para dar a qualquer um aquilo que é seu por direito. “As honras e as riquezas que possuem pertencem mais a sociedade que a sua pessoa, então não pode dispor-lhes a seu gosto, mas deve repartir-lo com base nos méritos e aos serviços feitos a sua pessoa ou a comunidade. (…) Para bem administrar os recursos da sociedade, o príncipe não deve ter em conta patrimônios e linhagens, mas as virtudes e as obras de qualquer um. Favorecer um rico só porque é tal, significa dar-lhe ocasião a mais para enriquecer-se e esbanjar sua riqueza (…). Por outro lado, honrar um homem só porque os seus antepassados foram valorosos fundadores da nobreza da sua família (…) significa desonrar a virtude e causar afronta aos próprios antepassados (…). Os pobres e aqueles que não são de sangue nobre, tem a esperança de progredir, se animam com o estimulo da honra e do prêmio, cumprindo ações maravilhosas ao serviço do bem comum. Por sua vez os nobres, vendo que  nada vale terem sido tais só por nascimento, para não perder a hereditariedade dos antepassados, se esforçarão para conservar viva a esplêndida tradição de sua família  (…) como o nobre merece ser honrado mais que o não nobre, quando confirma com as suas próprias ações o prestígios dos antepassados, assim eles não mereceriam nenhuma honra nem favor quando se abastardam e renegam os valores de seus antepassados” ([14]). Portanto o príncipe cristão deve antepor, o pobre virtuoso ao nobre dissoluto, o homem de baixa linhagem mas capaz, a falsa nobreza, pois na verdade, apenas a virtude é a verdadeira nobreza. No capítulo nono nos explica que a virtude da justiça faz a diferença entre o rei e o tirano. “No repartir encargos e honras, o príncipe deve ser guiado por um critério de justiça. Ele não é senhor absoluto dos bens de seus súditos. (…). Se consideramos (…) as falsas doutrinas dos políticos  descobriremos que (…) miram a instituir uma abominável tirania em lugar de um governo justo e legítimo (…). O verdadeiro rei é sujeito a lei divina e natural, enquanto o tirano segue exclusivamente a lei da sua vontade. O rei professa a salvaguarda da piedade (…), enquanto o tirano não tem em alguma conta, a fé e a justiça. Um é atento ao bem público e a defesa do povo, enquanto o outro mira exclusivamente o próprio lucro; um enriquece os súditos por quanto lhe é possível, o outro aumenta o seu patrimônio pessoal com a ruína deles. Um vinga a ofensa contra Deus e a sociedade, perdoa aquela contra a sua pessoa, o outro vinga cruelmente está última e perdoa as outras” ([15]). No capítulo décimo escreve que o bom príncipe é  equo no impor as taxas. “O príncipe justo é chamado também pastor, porque deve reger e governar, como o bom pastor, a sua grei, defendendo-a dos lobos e dos doentes, buscando realizar o seu bem. Sobretudo em uma coisa o príncipe assemelha-se ao pastor: como o pastor tosa a grei sem esfolá-la, assim se comporta o bom príncipe na imposição dos tributos” ([16]). Então a primeira preocupação do príncipe em matéria fiscal, é de não escutar os aduladores que, por interesse, buscam todos os dias novos arbítrios para sangrar o reino.  A segunda é que deve mostrar que as taxas são devidos a necessidade do Estado e não ao seu capricho, de modo que os cidadãos o ajudem e não desdenhem diante do espetáculo de um rei que não sendo rico desperdiça o dinheiro público em despesas inúteis  Além disso, é justo que um rei seja rico para poder fazer o bem a quem lhe tem necessidade, para resistir aos inimigos; porém estás riquezas não vão acumuladas em detrimento da riqueza do reino, mas com cautela porque se reúnem grandes riquezas mais com o gastar pouco, que com o receber muito. No décimo nono capítulo fala da escolha dos juízes e das suas tarefas. Não serve a nada um príncipe amigo da justiça se não escolhe com cuidado os ministros mais mais dignos e não velando sobre suas ações. No décimo oitavo escreve sobre a clemência que deve ter o príncipe cristão. “Toda coisa que diz respeito a justiça devem ser acompanhadas da misericórdia, porque se a misericórdia sem justiça é fraqueza, uma justiça sem misericórdia se converte em crueldade. (…) Ao contrário os princípios muito severos e rigorosos se tornam antipáticos e, puxando muito a corda, a rompem (cap. 19º)” ([17]). No capítulo vigésimo quarto trata da necessidade de ter bons conselheiros. “Todo príncipe tem necessidade de um bom conselho, a causa da fraqueza e da miséria do homem, que tem necessidade de muitos apoios e ajudas para não cair. Em contingências particularmente graves todo homem deve recorrer a um conselho e não fiar-se apenas ao seu parecer pela fraqueza do intelecto e a força das paixões que cegam e aniquilam também as mais fortes das vontades. A verdadeira prudência… ensina… também a saber se beneficiar do conselho dos outros… Quem não se atém a está regra acaba pecando por presunção (…) S. João Crisóstomo afirma: ‘é próprio apenas a Deus o não recorrer aos conselhos dos outros, como ao invés devem fazer todos os homens’ (…) Um príncipe muito sábio, mas inimigo da ajuda dos outros, é pior que um príncipe pouco culto, mas disposto a fazer-se guiar pela prudência de quem compensa suas deficiências” ([18]). No vigésimo quinto analisa o papel dos conselheiros. “Para que um homem se fie de um outro e creia nas suas palavras, três são as coisas necessárias, segundo Aristóteles: a prudência, a amizade ou benevolência e a virtude. A prudência é necessária para entender bem e não enganar-se sobre aquilo que é dito; a amizade porque mais facilmente somos propensos a dar ouvidos àqueles que nos fazem bem, e a virtude (…), porque nenhum julga mentiroso aqueles que estima como virtuoso. Sobretudo a está última, o príncipe deve dar atenção no escolher os conselheiros… A virtude, na verdade merece estima por si mesma e nada tem valor sem ela. O príncipe creia que, onde tem verdadeira e sólida virtude,  não pode existir espaço para o engano. (…) São Gregório Nazianzeno disse que um conselheiro deve ser dotado de grande experiência, muita caridade e liberdade de palavra. (…) O principal dote do conselheiro em uma república é o conhecimento aprofundado da própria república (…). É necessário, então, conhecer tudo isto que é relativo ao Estado, a paz, a guerra, a lei e a economia. Ser prudente em um campo não comporta necessariamente que se seja prudente em todas as ocasiões (…). Convém então que os príncipe se sirvam dos homens em grau de enfrentar as mais díspares questões ou, em falta, de vários conselheiros, qualquer um especializado em um particular gênero de problemas… O segundo dote necessário é a amizade (…), com o qual se entende o desejo de ajudar por quanto é possível e de fazer o bem com a própria ajuda, sem mirar o lucro pessoal ([19]). O terceiro dote necessário, é tratado no capítulo 26º, essa consiste no saber exprimir livremente o próprio parecer (…) não serve a nada que o conselheiro seja prudente, escrupuloso e hábil na resolução dos problemas, se  em seguida não tem coragem de expô-la (…). Uma coisa é ser prudente e virtuoso, outra é ser um bom conselheiro, porque sem está liberdade a prudência e a virtude não dão nenhum fruto. (…) As vezes para não ofender o príncipe, outras vezes para agradá-lo, sucede que o conselheiro silencia (…) ou (…) que diga o contrário daquilo que pensa. Os conselheiros são fracos (…) as vezes por um mal comportamento do príncipe, que as vezes pede conselho por pura formalidade, tendo já decidido as suas ações, e mostra-se mal em suportar a quem o contradiz. Tal comportamento é nocivo e impulsiona os conselheiros a dizer só aquilo que ao príncipe da prazer (…). O bom príncipe não deve se ofender se qualquer um não é de acordo com as suas ideias, mas ao contrario deve encorajar com paciência e benignidade” ([20]). No capítulo vigésimo nono o jesuíta espanhol ensina ao príncipe como defender-se dos aduladores. “A prudência é necessária também (…) para distinguir o verdadeiro do falso amigo, para reconhecer o adulador do conselheiro fiel (…). O homem, alimenta nas vísceras um amor próprio que o cega, o ilude, o faz crer  merecer muito, de poder ser anteposto aos outros… e o incita a ter estima de si e desprezo pelos outros. (…) Em gênero é um sentimento mais forte nos reis e nos príncipes, porque a corrupção da natureza humana aumenta com o luxo e o comando (…). Ora se a chama que reina nos príncipes (…) é alimentada pela adulação, que coisa nos pode esperar se não que consuma o próprio príncipe, transformando em cinza todo o seu Estado? Com palavras mais escorregadios que o óleo e conselhos como flechas agudas a perfurarem os corações dos príncipes (…). O mais perigoso entre os animais ferozes é o tirano e entre os animais domésticos o adulador.(…) O adulador que corrompe a verdade, é pior que o falsário. (…)Infelizmente no fim os aduladores prevalecem sujeitando o ânimo de quem escuta, porque as suas palavras são conforme o amor próprio, isto é aquele adulador interior que nós todos possuímos e que falsamente nos prega nós mesmos” ([21]). No trigésimo terceiro demonstra como discernir o verdadeiro amigo do falso. “Nada é mais difícil e mais útil que conhecer a si mesmo, então os aduladores obscurecem a luz que Deus infundiu nas nossas almas, sem a qual não podemos nem ver nem conhecer. No que diz respeito aos verdadeiros e falsos amigos, é muito difícil distinguir-lhe, porque embora seguindo a finalidade oposta, se servem de meios muito similares. A verdadeira diferença substancial consiste no fato que o verdadeiro amigo ama com amor sincero, sem fins pessoais, enquanto o adulador ama primeiramente o próprio interesse em vista de vantagens pessoais. (…) O verdadeiro amigo, no julgar um afazer, primeiramente olha o bem ou o mal que podem derivar ao príncipe ou a sociedade; o adulador subitamente considera que ganho ou dano a coisa pode causar-lhe. (…) O verdadeiro amigo busca contentar por quanto possível, sem voltar atrás quando é o momento de dizer a verdade, coisa que faz com a modéstia e liberdade, porque prefere causar um efetivo benefício a seu senhor, mais que agradá-lo quando não é o casoO adulador… se preocupa em dizer aquilo que dá prazer, afastando tudo aquilo que poderia entristecer o príncipe, para melhor enganá-lo e convencê-lo. (…) Para saber se um amigo é verdadeiro ou falso, o príncipe deve preferir mostrar aquilo que pouco antes o desgostava e vice-versa: subitamente o adulador o dará razão dizendo que antes se maravilhava do seu parecer… Ao contrário o verdadeiro amigo, que conhece a diferença entre bem e mal, não se comportará de tal modo (…). Além disso, o príncipe deve seguir a própria consciência e se está o censura enquanto o adulador o louva, entenda que se trata de uma clara mentira, e não de verdadeira lealdade” ([22]). No trigésimo quarto nos fala da fortaleza do príncipe cristão e daquela do príncipe de Maquiável. A fortaleza representa o sigilo e a custódia de todas as outras virtudes, então vem cronologicamente por último, mas não por importância hierárquica. Segundo Maquiável os antigos pagãos eram mais fortes que os cristãos e isto por culpa da educação moral do cristianismo. Na verdade o cristianismo nos ensina a não estimar as honras do mundo; enquanto o paganismo lhes faz estimar tanto como se fosse o fim último do homem, e isto tornava as suas ações mais ferozes. (…) Para demonstrar melhor está idiota impiedade e a ímpia absurdidade deste miserável mestre dos políticos modernos ocorre ter presente que (…) segundo a sã filosofia, a virtude da fortaleza não é uma espécie de força corporal assustadora (…). Nem sequer consiste em um ânimo desdenhoso e temerário, que sem considerar se uma coisa é (…) perigosa ou fácil, arriscada e imprudente, se deixa arrastar por um impeto furioso e de louca temeridade (…). Em realidade nós estamos falando da fortaleza como virtude moral, arma do homem forte para resistir o temor vão, moderar os ímpetos  empreender coisas dificultosas que comportam perigos mortais, sofrer assaltos com vigor e penas com constância (…) tudo isto para a glória do Senhor (…). Está é a fortaleza que chamamos virtude; enquanto aquela de Maquiável (…), podemos defini la apenas como orgulho bárbaro. (…) Assim se a fortaleza é uma virtude, quem será mais forte, o homem vicioso ou o virtuoso, o mal ou o bom? E se é um dom de Deus, a quem o Senhor o comunicará, aos amigos ou aos inimigos (…). A quem adorava as pedras ou o lenho ou aos cristãos que adoram o Criador do Universo (…).  Então, por força das coisas, o cristão é mais forte que os gentios” ([23]). Além disso, Ribadaneyra demonstra que a suave educação do século XVI não é aquela cristã, mas aquela humanista do renascimento ou neo-pagã; de fato o Evangelho prega dureza, pobreza, temperança, trabalho e todas virtudes que geram a fortaleza, e impõe a educação dos filhos com severidade. No quadragésimo e último capítulo nos ensina que o príncipe cristão deve honrar a arte militar. De fato “os bons soldados são os defensores da sociedade e do reino, protegem os trabalhadores, os jovens, as mulheres e os príncipes. (…) Além disso é necessário que seja tida em grande conta a disciplina militar, de modo que os soldados sejam verdadeiramente ancorados a fortaleza cristã e não sejam bandidos de estrada, sejam ministros de Deus e não de Satanás, defensores e não destruidores da pátria (…). Sem está disciplina os soldados se tornam uma ruína ([24]).

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(2a parte)

B) S. ROBERTO BELARMINO S. J.

Também o Doutor das Controvérsias sentiu a necessidade de repelir os erros de Maquiável, o fez no seu livro De officio principis christianide 1682. Neste ensina, no livro primeiro capítulo primeiro, que o príncipe é ministro de Deus, mas deve fazê-lo com sinceridade de coração, e deve sentir-se antes de tudo o lugar-tenente de Deus. “Portanto os reis da terra não são patrões absolutos de seu principado, mas governadores a tempo do reino concedido a ele pelo Rei supremo, com a obrigação de prestar-lhe conta no tremendo juízo” ([25]). O santo Doutor da Igreja continua: “Pelo Senhor lhes foi dado o domínio (…), o qual examinará as vossas obras e perscrutará os pensamentos. Porque, ministros do seu reino, não governaram retamente (…). Terrível e veloz Ele saltará sobre vós; porque rigorosíssimo juízo será daqueles que estão no topo (…). Existe muita diferença entre os pecados dos príncipes e aqueles dos cidadãos privados, no que toca os primeiros os interesses de muitos e os segundos os interesses de poucos” ([26]). Naquilo que diz respeito ao agir do príncipe cristão, Belarmino escreve: “Não deve impor leis da sua cabeça, mas deve governar os povos com leis dadas pelo Senhor seu Rei, porque não governa povos verdadeiramente e absolutamente seus, mas povos de Deus (…) portanto deve estar atento a não impor coisas contrárias a lei divina (…) mas também com o exemplo e com as obras, deve fazer de tudo para não violar, ele próprio, as leis divinas (…). Deus de fato se ira, quando vê transgredidas as suas leis propriamente por aqueles que quis como ministros do seu reino, para ter junto ao povo com o sentido de dever e observância das leis divinas” [(27)]. No capítulo segundo escreve: “O príncipe sábio (…) deve tratar de modo diverso os súditos impios e perversos, que são (…) filhos do diabo, e os súditos religiosos e santos que tem direito ao reino eterno” ([28]). No capítulo quarto fala do dever do príncipe para com o Papa: “O Sumo Pontífice na Igreja é pai, pastor, doutor, sentinela e Sumo Sacerdote. (…) Ora sempre o Pontífice foi anteposto ao príncipe (…) porque o Pontífice preside as coisas divinas e o príncipe as coisas humanas (…) no mundo são muitos príncipes, mas um só Pontífice (…). S. Bernardo assim fala: ‘como toda alma foi submissa a potestade superior e quem resiste a potestade resiste a Deus (…) [ocorre] mostrar respeito a Suma e Apostólica Sede” ([29]). No quinto capítulo, o Belarmino trata do dever do príncipe para com o Bispo. “Beata aquela cidade a qual é tocada ter um Bispo e um príncipe santo, os quais do amor e do acordo outro não busquem que governar bem o povo (…). O Bispo é pai, pastor, doutor, seja do príncipe que do povo. E (…) é o príncipe o dever de ser sujeito ao Bispo (…) não é comparável a autoridade dos príncipes àquela episcopal (…) São João Crisóstomo (…) afirma que o sacerdócio é tanto mais sublime para o reino quanto pode ser a diferença entre o espírito e a carne” ([30]).  No capítulo sexto analisa o dever do príncipe para com o seu confessor. “O sacerdote confessor do príncipe (…) é juiz e tem a potestade no foro interno de ligar e desligar. É sinal evidente que durante a confissão o sacerdote sente com a cabeça coberta, enquanto o penitente, qualquer um que esse seja, também se rei e imperador, ajoelhe-se, com a cabeça descoberta (…). Ora a salvação do príncipe depende em modo particular do confessor (…). Guiar as consciências dos príncipes é uma tarefa enorme e requer um homem não apenas expert, mais também muito prudente e constante e (…) que não tenha algum desejo pessoal, não tenha ambição alguma, busque e queira apenas a salvação eterna de seu príncipe e de seus povos. (…) Se o confessor não tem a coragem de recusar a absolvição a um homem assim importante, escute aquilo que diz o Espírito Santo: “Não busque tornar-se juiz, se não tem a força para erradicar as injustiças, porque tu não tem que temer em face dos poderosos” (Sir. VII, 6) (…). Não é integra a confissão de um príncipe que confessa os pecados cometidos como cidadão privado (…) e não manifesta, ao invés, os pecados cometidos enquanto príncipe. Não faltam príncipes que, naquilo que diz respeito a própria pessoa, são muito pios e justos, mas não conhecem os pecados dos seus colaboradores (…). E entretanto os pobres são oprimidos, os processos alterados e os pequenos escandalizados. A ignorância desculpa o príncipe apenas se é invencível. Portanto ele deve refletir seriamente sobre a qualidade dos ministros e  indagar sobre seu comportamento e sobre seu modo de governar. O confessor, então, não deve contentar-se com a confissão que o príncipe faz como homem privado, especialmente se sabe da opinião pública, ou de outro modo, que os seus ministros não se comportam bem na administração do Estado” ([31]). Belarmino aconselha ao confessor “se nota que com qualquer príncipe perde o seu tempo, porque estes não querem seguir os seus justos amonimentos ele mesmo peça humildemente para ser exonerado e, se não lhe é concedido, tome sozinho a decisão. De fato, é menos grave suportar a ira do príncipe terreno que aquela de Deus” ([32)]. No livro primeiro capítulo décimo o santo Doutor ensina que a justiça vingativa, relativamente ao castigo daqueles que agem mal, é necessária ao Estado, de modo que pela pena de um só muitos desistam de causar injurias e assim da justiça surja a paz e a tranquilidade. Moisés era o mais manso dos homens e, todavia pelo zelo da honra de Deus, comandou que viessem a ser mortos milhares e milhares de pessoas que haviam adorado o bezerro de ouro. Assim, quando vem castigados os malvados, os bons que eram oprimidos de cativos, vem libertados de um grave perigo, pela misericórdia do príncipe. Portanto a severidade do príncipe, no aplicar a justiça, é de louvar-se, seja porque os outros, intimidados, fujam dos pecados, seja porque os bons vivam sem temor uma vida quieta e tranquila. No capítulo décimo primeiro do livro, São Roberto mostra que “a fortaleza é necessária ao príncipe para governar os povos, essa se manifesta sobretudo na guerra e, também se pertence a todos os soldados, todavia se adequa particularmente ao príncipe, que é chefe e guia (…) e que fortifica o ânimo dos soldados com a sua fortaleza (…) mas existem guerras mais graves e mais atrozes: aquelas do demônio contra as almas (…). Neste combate espiritual os príncipes cristãos devem ajudar a Igreja (…) como escreve Santo Agostinho na Carta a Vicente Donatista, onde demonstra que é justo que os pagãos e os hereges sejam punidos pelos príncipes terrenos. Também São Gregório, na Carta ao Prefeito da África Pantaleão, escreve para esmagar os hereges donatistas e, na sua Carta ao Imperador Maurício e a Brunilde (…), para perseguir como idólatras, os hereges. E também em paz o príncipe deverá trabalhar muito e frequentemente permanecer acordado durante a noite, pensando e repensando os remédios que precisará preparar para os seus súditos ([33]). No décimo quinto capítulo demonstra que a clemência é necessária ao príncipe para governar os povos. “Se a alma (…) começa a tratar o seu corpo muito severamente, com jejuns e vigílias este, rebelando-se, recusa de fazer o próprio dever. Assim se o príncipe, sobre o exemplo, da alma ou do espírito, governa os povos como seus membros com clemência e doçura e impõe um jugo suportável, (…) experimentará por sua vez, que os povos o amem, são obedientes e fidelíssimos sem excitação  Se, ao contrário, experimentam o seu príncipe não como um pai clemente, mas como um patrão severo, estes não deverão maravilhar-se se será odiado e abandonado pelos súditos quando terá maior necessidade de ajuda” ([34]). No décimo sétimo capítulo coloca em guarda o príncipe a não deixar-se dominar pela mulher, de fato “temos exemplos nas Sagradas Escrituras dos quais podemos conhecer o quanto seja a incapacidade da mulher de conter-se e a quais horrendos precipícios as mulheres tem empurrado os seus maridos (…) Eva a mulher de Adão (…) Dalila a mulher de Sansão (…)” ([35]). No vigésimo capítulo nos fala dos deveres para com os  cortesões. “Esses com facilidade adulam o seu patrão. (…) Está adulação, a maneira de doce veneno, facilmente penetra no ânimo, se não encontra um coração verdadeiramente humilde e submisso completamente a Deus. Quando o veneno da adulação preenche o ânimo do príncipe é incredível a dizer-se quantos e quanto graves danos causa. Quem esculta os aduladores, incha para a soberba, pensa em coisas grandes e maravilhosas que deverão lhe acontecer e acreditam que a ele tudo seja fácil. Portanto não segue os conselhos sapientes” ([36]). Enfim no vigésimo segundo capítulo, São Roberto avisa o príncipe a pensar em Deus seu fim último que o criou para ser conhecido, amado e servido, e mediante isto salvar a alma, portanto os príncipes devem pensar seriamente a salvação eterna.

***

 

(3a parte)

C) ANTÔNIO VIEIRA S.J.

Antônio Vieira, nasce em Lisboa em 6 de fevereiro de 1609 e em 1623, com quatorze anos, entrou nos jesuítas; depois de ser enviado ao Brasil, desenvolve numerosas missões diplomáticas na França, Holanda, Inglaterra e em Roma; em 1652 retornou ao Brasil, passou ainda em Roma em 1669 e em 1681 re-atravessou o oceano e retornou ao Brasil, onde morre em 18 de julho de 1697. Apesar do seu zelo, teve – segundo a Encíclopedia Católica – problemas com a inquisição, por causa de uma excessiva credulidade em uma certa revelação privada, singular e extravagante. Em realidade segundo Yosef Hayim Yerushalami (Da corte ao gueto. A vida e as obras, as peregrinações dos marranos Cardoso na Europa do século XVI, Garzanti, Milão, 1991, cap. VII, pag.. 273-276: Sabatianismo e sebastianismo?): Padre Vieira era um adepto do sebastianismo, uma forma de messianismo judaico o qual sustentava que o rei de Portugal Sebastião (+1578), retornaria a Portugal para salvar os portugueses, então submetido a Espanha. Os partidários do mito eram os marranos portugueses, sustentados pelo Padre Antônio Vieira S.J., o qual foi aprisionado pela Inquisição por três anos (1665-1667); ele havia sustentado em 1665 que o rei Sebastião voltaria como Messias ([37]). Reporto os “quatro sermões” que possuímos em italiano, e no presente capítulo me baseio apenas sobre esses e coloco em guarda o leitor para as outras obras, especialmente aquelas de caráter messiânico. A sua produção oratória foi vastíssima, em português existem quinze volumes de Obras oratórias póstumas, editadas por Lello & Irmão, Porto, 1951. Nas quatro pregações aos homens de governo, tidas a Lisboa, mostra qual deve ser a concepção cristã da política, diametralmente contrária àquela neo-pagã de Maquiável. Segundo ele a ação e a doutrina política não podem prescindir de Deus, que as move e finaliza. Deus criou o homem animal social, é Causa eficiente remota da Sociedade civil e é o fim último do homem individual e vivente em sociedade. Este é o problema politico  se esse é bem definido e bem resolvido, se terá a paz e a ordem e a vida virtuosa que são a estrada do Paraíso. Mas se o problema é mal colocado ou mal resolvido, se terá o caos ou o terror, o vicio e a desordem que são a estrada para o inferno. A partir destes dois pontos capitais, o jesuíta português, traça o quadro da concepção católica da política: essa é muito franca, plena de bom senso, direta, acessível a todos. Também se a substância é assaz símile ao que vimos em Ribadeneyra e Belarmino, o modo de exposição, os exemplos, a estrada seguida é muito original e tocante, simples e sincera como o bom senso de um velho montanaro (atenção “nem tudo que reluz é ouro” diz o provérbio); e portanto que exporei brevemente.

 

1°) O bom conselho:

A primeira consideração que Vieira faz, na pregação tida a corte real de Portugal em 1662, é que a boa política depende do bom conselho, e para ter um que seja verdadeiramente tal ocorre escolher bem os conselheiros. A matéria sobre a qual deve se aconselhar, deve ser atinente a profissão do conselheiro: sobre a fé e a moral o conselheiro será o Padre, sobre a guerra aconselhará o soldado, sobre a navegação o marinheiro. Se o mundo vai mal significa que os príncipes são mal aconselhados por pessoas que falam de coisas sobre as quais não são competentes e sobretudo por “castelhanosintrigantes que podem adulador e conquistar a simpatia do príncipe, para ele fazer, então, aquilo que eles querem.

 

2°) Formular bem as propostas:

Não existe nada de mais letal que uma proposta mal formulada. Atenção aos conselheiros ou aos conselheiros ou aos príncipes que dizem: veremos, faremos. Esses fazem parte da primeira classse de homens dos quais fala os Exercícios de Santo Inácio nº 153, são eles que adiam o problema sempre ao dia seguinte: “cras, cras”. São chamados corvos, são sempre morosos, especialistas na arte de adiar, para não enfrentar a realidade. Mas a política do avestruz, como se sabe, não paga. Esconder a pequena cabeça na areia, deixando exposto o resto do corpo, notavelmente mais volumoso. Isto é perigoso, e a avestruz, embora iludindo-se de estar segura, se torna uma fácil presa para o seu inimigo. Ao invés o bom príncipe e o bom conselheiro dizem: façamos, agora tudo o que deve ser feito. Não deixemos para amanhã, aquilo que pode ser feito hoje. Odeio aquilo que devo fazer, mas como devo fazê-lo é melhor que o faça agora. Como a Santíssima Trindade, que vendo os homens andando ao inferno disse: façamos a Redenção do gênero humano (Exercícios espirituais de S. Inácio, nº 101). E a fez no instante, sem reinviá-la dia após dia para as “calendas gregas”. “Os homens do faremos não são homens, e tanto menos homens que possam fazer o rei ou aconselhá-lo (…). Não existe coisa no mundo da qual um rei deva maiormente fugir, que do homem do faremos” ([38])

 

3°) Eficácia e prontidão da execução:

O conselho do sinédrio condenou e fez matar Jesus em doze horas, da meia-noite da Quinta-feira Santa às 12 horas da Sexta-feira Santa, quando Jesus foi crucificado e expirou depois às 15 horas. E a história continua, por ora, (…) na Palestina e no resto do mundo ocidental… “Até quando não se dá execução aos decretos (…) não se é dado início a nada (…) O conselho de execução é aquele que faz as coisas” ([39]).

 

4°) Nem carta nem tinta:

“Carta e tinta são dois elementos pouco úteis em um conselho” ([40]). Esses servem, na maior parte dos casos, ao retardo da atuação do conselho. O autor não condena absolutamente o uso da carta e da pena, mas o excessivo uso desses, que é aquele que hoje chamamos burocracia, que tanto tempo e dinheiro faz perder o Estado e o cidadão.

 

Politica e lei de Deus

“A verdadeira política deve basear-se sobre o temor de Deus, sobre o respeito de Deus!(…) A verdadeira arte de governar é a de seguir a sua lei!(…) Qualquer política que exclui a lei de Deus é ignorância, engano, erro, mal governo e ruína” ([42])

   

DON CURZIO NITOGLIA

20 de abril de 2010

Link a questa pagina:http://www.doncurzionitoglia.com/Principe_Cristiano_Vs_Principe_Machiavelli.htm


NOTE

[1] P. DE Ribadeneyra S.J., Il principe cristiano, Cantagalli, Siena, 1978, I vol., introduzione a cura di P. Caucci, pag. 23.

[2] Ibidem, pag. 45.

[3] Ibidem, pag. 84.

[4] Ibidem, pag. 123.

[5] Ibidem, pag. 134.

[6] Ibidem, pag. 174.

[7] Ibidem, pag. 182.

[8] Ibidem, pag. 196.

[9] Cfr. nota n° 170.

Cfr. S. T., II-II, qq. 123-140 (su la Fortezza e la Magnanimità).

[10] S.T., I-II, q.63, a.3./  I-II, qq. 64-67./  I-II, q.110, a.4, ad1. / I-II, q.68, a.2. Cfr.A. Royo Marìn O.P., Teologia da perfeição cristã, ed Paoline, 1965, 6ª ed., Roma, pagg. 119-123. Cfr. J. Dumont, A Igreja matou o Império Romano e a cultura antiga?, Effedieffe, Milano, 2001. A. J. Fustigière, Hermetismo e mistica pagã, O Melangolo, Genova, 1991. P. F. Beatrice (a cura di) , A intolerância cristã para com os pagãos, EDB, Bologna, 1993.

[11] P. De Ribadeneyra S.J., op. cit., II vol., pag. 10.

[12] J. Bossuet, Discours sur l’histoire universelle, Garnier- Flammarion, Paris, 1966, pag. 293.

Roma “religio-pagana”

O mundo inteiro, se divide em duas grandes religiões: aquela da Santíssima Trindade e aquela de Satanás (que dão lugar a várias seitas e cisões, reconduziveis todas ao seu mestre), destas religiões seguem duas políticas: a Cristocracia e a Satanocracia. A Satanocracia teve como capital: Jerusalém deicida, destruída em 70 d.C. pelos Romanos, e Roma religião pagã dos Césares, a qual substituiu Jerusalém deicida, até que não se converta a Cristo (IV século d.C.). A Cristocracia tem como capital a Roma dos Papas. Nesta página falamos da Roma religião pagã até 313 d. C., e neo-pagã a partir do Humanismo e da Renascença, até a violação da Porta Pia e a Itália do ressurgimento e post-ressurgimento. A Roma antiga e pagã era caracterizada pelo panteísmo e pela idolatria politeísta. Roma quanto a religião, sucede a Babilônia, torna a patroa do mundo, a metrópole da idolatria e a fortaleza de Satanás (Cfr. Santo Agostinho, De Civitate Dei, lib. XVIII, cap. II e ss.). No paganismo Satanás era verdadeiramente o ‘deus’ do mundo (Omnes dii gentium, demonia recita o salmo). O paganismo depois de ter sido a religião dos assíros-babiloneses, dos egípcios, dos gregos e dos romanos, encontrou em Roma o Vigário de Cristo que derrota, derramando o próprio sangue sobre os montes do Vaticano, Satanás e o paganismo Romano. Antes a Providência se serviu da grandeza material de Roma, praeter intentionem fundatoris, para difundir o Evangelho em todo mundo. Mas por trezentos anos Satanás e Roma perseguiram Cristo e os cristãos, com ódio infernal. E depois foi caçado por Roma, governada pelo Vigário de Cristo, Satanás sempre procurou de nela reentrar. Infelizmente com o Humanismo e o Renascimento o espírito cabalista e pagão retoma a marcha, ainda se não totalmente, a Roma e dalí ao mundo inteiro, espalhando os seus erros e as suas revoltas em toda parte (Cesarismo, Protestantismo, Revolução americana, inglesa e francesa, Comunismo, Mundialismo) até 1870, quando uma seita infernal a judaico-maçonaria, caça o Vigário de Cristo em Roma, para adorar César. Mas a luta continua, Pedro retorna a Roma, até que depois da morte de Pio XII, o naturalismo neo-pagã retoma espaço, tento ocupado, infelizmente, o próprio Vaticano, onde se expande a mancha do óleo e prepara o reino do Anticristo.(Cfr. J. J. Gaume, Traité du Saint-Esprit, tomo I, Paris, Gaume-Duprey, 1864, pagg. 463-502). 

 

[13] P. De Ribadeneira, op. cit., pagg. 15-16.

[14] Ibidem, pagg. 33-35.

[15] Ibidem, pagg. 45-46.

[16] Ibidem, pag. 49.

[17] Ibidem, pag. 85.

[18] Ibidem, pagg. 99-103.

[19] Ibidem, pagg. 99-107.

[20] Ibidem, pagg. 108-111.

[21] Ibidem, pagg. 115-118.

[22] Ibidem, pagg. 119-122.

[23] Ibidem, pagg. 136-140.

[24] Ibidem, pagg. 170-171.

[25] R. Bellarmino, Scritti Spirituali, il dovere del principe cristiano, Morcelliana, Brescia, 1997, pag. 37.

[26] Ibidem, pag. 43.

[27] Ibidem, pag. 45.

[28] Ibidem, pag. 53.

[29] Ibidem, pagg. 77 e 79.

[30] Ibidem, pag. 79 e 81.

[31] Ibidem, pagg. 89 e 91.

[32] Ibidem, pag. 93.

[33] Ibidem, pagg. 127 e 129 e 131.

[34] Ibidem, pag. 159.

[35] Ibidem, pagg. 175 e 177.

[36] Ibidem, pag. 203.

[37] Cfr. também C. Roth, História dos marranos.A odisséia dos ‘hebreus invisíveisi’ da inquisição aos nossos dias, Serra e Riva, Milão, 1991, pagg. 272-277). A. Sicroff, Les controverses des statuts de puereté de sang en Espagne du XV au XVII siècle, Paris, 1960. H. J. Zimmels, Die Marranen in der Rabbinischen Literatur, Berlin, 1932. S. Assaf, Os marranos espanhóis e portugueses em respostas (em hebraico), «Me’ assef», vol. V, pagg. 19-61. D’Azevedo, História de Antonio Vieira, Lisboa, 1908-1931, 2 voll. Gli escritos messiânicos de A. Vieira se encontram na suas Obras escolhidas, vol. VI, que contém a importante Esperanças de Portugal, quinto imperio do mundo, pagg. 1-66. Cfr. anche M. Gonçalves Viana [ao cuidado de], Cartas do Padre Antonio Vieira, Oporto, s.d., pagg. 135-164).Vieira foi também um un milenarista empregnado profundamente do pensamento teológico de Joaquim de Fiore. Cfr. m. reeves – w. goulo, Joachim of Fiore and the myth of the Eternal Evangel in the nineteenth century, Clarendon Press, Oxford, 1987, p. 22.

[38] A. Vieira S.J., Quattro prediche agli uomini di governo, Centro Studi Sociali, Milano, 1960, pag. 26.

[39] Ibidem, pagg. 30-31.

[40] Ibidem, pag. 35.

[41] Ibidem, pagg. 40-41.

[42] Ibidem, pagg. 43-45.

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