DON CURZIO NITOGLIA: SIONISMO E GENOCÍDIO DOS PALESTINENSES

Uma disparidade de opiniões e de cifras

DON CURZIO NITOGLIA

[Tradução: Gederson Falcometa]

10 de fevereiro de 2011

http://www.doncurzionitoglia.com/sionismo_e_genocidio_palestinesi.htm



Introdução

Padre Giovanni Sale escreveu um interessante artigo na revista La Civiltà Cattolica, caderno 3854 de 15 de janeiro de 2011, intitulado “A fundação do Estado de Israel e o problema dos refugiados palestinenses” (pg. 107-120). Antes de tudo, nos recorda que os primeiros “kamikazes terroristas” foram os próprios Israelenses e não os Árabes, como hoje se pensa comumente. De fato, em 22 de julho de 1947 o Irgun fez explodir uma carga de dinamite no Hotel King David, onde residia o “Quartel general” da Grã-Bretanha, matando 91 pessoas. Seguiram outros atentados e assim a Inglaterra decidiu, em fevereiro de 1947, renunciar ao mandato sobre a Palestina (p. 108). Além disso, recorda que já em 1946 existia uma forte “pressão” (“lobbyng”) da comunidade hebraica americana sobre o Presidente Truman, que pela nova campanha presidencial tinha necessidade de dinheiro e dos votos dos hebreus-americanos. No mesmo ano também a URSS de Stalin se declarou favorável a divisão da Palestina. O “Departamento de Estado” estadunidense não estava de acordo com a “Administração presidencial”, mas foi propriamente graças a intervenção da “Administração americana” que o deserto do Negev foi incorporado ao Estado de Israel e não a Palestina como queria o “Departamento de Estado”. Portanto, já em 1946 estava decidido, sobre a pele dos Palestinenses, que Israel ocuparia «55% da Palestina, com uma população israense de 500 mil pessoas»1. Agora, nos perguntamos, como era possível, segundo a justiça, que 37% da população hebraica obtivesse 55% do território palestinense, do qual até então havia possuído apenas 7%? A resposta é somente a usual: a shoah do povo hebraico lhe dava o direito a uma Pátria. Mas, se rebate, o que tinham haver os Palestinenses com o agravo sofrido pelos hebreus na Europa norte-oriental? Um historiador palestinense escreveu a propósito: «Os Palestinenses não entendiam porque se entregava a eles as contas do holocausto. [..]. Não entendiam porque era injusto que os Hebreus permanecessem minoria em um Estado Palestinense unitário, e ao invés, fosse justo que quase a metade dos Árabes palestinenses, se tornasse da noite para o dia, uma minoria sujeita a um povo estrangeiro»2. Evidentemente a lei não é igual para todos.

O peso da shoah

Como se pode constatar, os efeitos foram enormes politicamente, economicamente (ressarcimentos), militarmente (guerras que ainda hoje perduram e talvez terminarão em um grande conflito nuclear) e religiosamente (judaização do ambiente cristão e católico a partir do Vaticano II). O Ocidente e a Europa, caídos em um sentimento de culpa coletiva, “psicanaliticamente induzido”, pensaram reparar o mal feito (ou feito acreditar pela psicanálise de massa da “psicopolícia”)3. A shoah continua a pesar, mas se senti qualquer ranger, que se busca sufocar com leis penais e “historicidas”.

A primeira guerra arábe-israelense

Pode ser dividida em duas fases: a primeira de novembro de 1947 a 14 de maio de 1948 e a segunda de 15 de maio de 1948 a outubro de 1949. A primeira fase foi sobretudo uma guerrilha, mas assaz cruenta, basta pensar no massacre de 100 civis Palestinenses por parte do Irgun, em 9 de abril de 1948, no vilarejo de Deir Yassin4. A segunda parte, ao invés, foi uma verdadeira e própria guerra convencional. Houve, então, uma retaliação árabe, quando um comboio médico hebreu foi atacado perto de Jerusalém e foram mortas 22 pessoas. O ano 1948 foi marcado por muitas retaliações hebraicas contra os Palestinenses, que estavam relutantes em abandonar o próprio território e opunham resistência a quem lhes queria tirar de casa. Infelizmente todo povo em guerra fez suas retaliações. Aquela da via Rasella em Roma não é a única, como  querem nos fazer crer. A segunda fase foi caracterizada por um episódio crucial que determinou a derrota dos Árabes, de forma incorreta, por parte dos Israelenses. De fato, em 11 de junho de 1948 o conde sueco Folke Bernadotte (que depois foi assassinado por alguns terroristas do Lehi) conseguiu negociar uma trégua. Essa foi acolhida por Israelenses e Palestinenses, mas «Israel aproveitou de tal período, violando os termos da trégua, para adquirir da Tchecoslovaquia, uma grande quantidade de material bélico [do III Reich alemão], que permaneceu inutilizado depois da segunda guerra mundial. Quando a guerra recomeça em 8 de julho de 1948, o exército israelense, utilizando os novos suprimentos europeus (e estadunidenses), conseguiu no curso de poucos dias ter vantagens sobre os exércitos arábes. […]. Deste modo, foram ocupados vários vilarejos árabes e as cidades de Lida e Ramle» (p. 114).

O genocídio dos Palestinenses por parte de Israel

Começou neste momento. De fato, a cidade de Lida foi ocupada e aconteceu uma verdadeira e própria «limpeza étnica» porque cerca de 70 mil habitantes de Lida foram expulsos e conduzidos a pé na “marcha da morte” para Ramlá, e, sob o sol de verão, morreram numerosas crianças e velhos5. A ordem de expulsão foi dada pessoalmente por Ben Gurion em 12 de julho6. É lícito falar de “genocídio”? Ou o único genocídio foi o do povo hebreu por parte do III Reich alemão? Antes de tudo, genocídio significa etimologicamente “genus” (estirpe) e “caedes” (matança), ou seja, «plano pré-estabelecido com a finalidade de matar em parte ou in totto um povo, por motivos nacionais, étnicos ou religiosos» (N. Zingarelli). Na história existem inumeráveis genocídios; quase toda guerra tem comportado um genocídio ou uma “limpeza étnica” por parte dos vencedores nos confrontos dos vencidos. Por exemplo, cinco milhões de Ameríndios ou Índios Americanos foram exterminados enquanto Ameríndios (“American Indian”) pelos colonizadores ingleses e holandeses que ocuparam o norte da América no Século XVII-XVIII. Um milhão e meio de Armênios, entre 1894 e 1918, foram massacrados enquanto Armênios e cristãos pelos Otomanos turcos e muçulmanos.  Os Italianos foram massacrados e lançados vivos aos milhares em cavernas verticais (Foibe) na Ístria, entre 1945-46, pelos “titinos” eslavos, apenas porque eram italianos. O decênio que iniciou em 1990 viu a “limpeza étnica” de centenas de milhares entre Sérvios, Bósnios, Kossovos e Croatas. No Iraque depois de 2003 os Curdos, os Sunitas e os Xiitas estão reciprocamente se “limpando etnicamente e religiosamente”7. Se pensamos na África, o que dizer de Ruanda, dos Usu e Tutzi, os quais se massacraram uns aos outros – chegando a um número de aproximado de 2 milhões de vítimas – até alguns anos atrás? No entanto, não é “politicamente correto” falar de genocídio para eles. Parece que existiu um só genocídio, antes “O” genocídio do povo hebraico entre 1942-455. Quem o coloca em dúvida assim como se apresenta pela propaganda dos vencedores, ou busca estabelecer cifras, estudar a questão, em alguns Países vai preso. Ora, porque não dar aos historiadores e aos cientistas a possibilidade e a liberdade de pesquisar atentamente os lugares, os documentos e o corpo do delito? Caso contrário os Palestinenses poderiam invocar um “crime de negacionismo” do genocídio que sofreram em 1948 e continuam a sofrer ainda hoje em Gaza (uma faixa desértica, que encerra – como um campo de concentração – um milhão e meio de pessoas, bombardeadas ontem, 8 de fevereiro de 2011, pela força aérea israelense).

A ‘shoah’ ou ‘nakba’9 palestinense

«O fato é que no fim da primeira guerra, menos da metade da população palestina ainda estava na terra natal […]. Sobre o número dos refugiados se discutiu muito no passado: os Israelenses falavam em cerca de 500 mil refugiados, os palestinenses, ao invés, falam de um milhão e meio de pessoas expulsas. Segundo os historiadores contemporâneos o numero de refugiados giraria em torno de 700-800 mil pessoas» (pp. 115-116). Como se vê se pode licitamente discutir, estudar, pesquisar as fontes sobre a real entidade da “catástrofe” palestinesa, mas por lei é proibido aos historiadores fazer pesquisas históricas sobre as fontes da catástrofe hebraica vivida entre 1942-45. Além disso, também para os Palestinenses vale a pergunta que a Europa se faz quanto a ceticidade diante da catástrofe hebraica de 1942-45: «Como é que um grande número de pessoas dentro de poucos meses deveriam abandonar a própria terra sem que ninguém no ocidente se preocupasse? A tese oficial sustentada por Israel é que os Palestinenses abandonaram “voluntariamente” o seu território. […]. Os Palestinenses, ao contrário, sempre sustentaram que os refugiados foram expulsos de modo sistemático e premeditado pelo exército israelense» (p. 116).

Revisionistas palestinenses

O primeiro historiador que refutou a vulgata israelense sobre o problema dos refugiados palestinenses foi o palestinense Walid Khalidi no seu livro supracitado All That Remains de 199210. «Ele, consultando os arquivos palestinenses e recolhendo a memória das testemunhas, reconstruiu de forma analítica – trazendo o elenco exato dos vilarejos destruídos – a “catástrofe”, isto é, a “nakbah”, vivida pelo seu povo. Tal estudo tem pouco eco entre os historiadores ocidentais, onde se continua a repetir a vulgata israelense do “exílio voluntário”» (p. 116). Então, o historiador israelense Benny Morris dedicou três volumes a este tema (Vítimas; 1948: Israel e Palestina entre guerra e paz; Dois povos uma terra) segundo os quais os Palestinenses não teriam sido caçados de propósito, mas em decorrência da guerra árabe-israelense teriam preferido o exílio ao estado de conflito e teriam deixado a Palestina impulsionados pela guerra e pelas “represálias” do Haganah. A expulsão dos Palestinenses, segundo Morris, não teria sido jamais decidida e decretada pelo Governo de Tel Aviv e pelo Exército Israelense, mas teria acontecido naquelas determinadas circunstâncias de guerra “civil”. Enfim, o historiador israelense Ilan Pappe no seu livro A limpeza étnica da Palestina11 refutou a tese de Morris e se aproximou daquela de Khalidi, demonstrando – documentos em mão – que o projeto de expulsão foi planificado em 10 de março de 1948 em Tel Aviv, na sede do Haganah pelos Governantes e Militares de Israel: «As ordens eram acompanhadas por uma minuciosa descrição dos métodos a serem utilizados para expulsar a população com a força: assédio e bombardeamento dos vilarejos, incêndios de casas, expulsões, demolições, e enfim colocação de minas entre os entulhos para impedir aos habitantes o retorno»12; em caso de resistência «as milicias armadas deveram ser eliminadas e a população civil expulsa para fora dos limites do Estado»12. Padre Giovanni Sale comenta: «tais ordens foram então transmitidas as brigadas que providenciaram a sua execução: o plano era o produto inevitável da determinação sionista de ter uma exclusiva presença hebraica na Palestina, e isto poderia ser realizado apenas eliminando a presença dos nativos do território» (p. 118). Ilan Pappe concluí: «o objetivo principal do movimento sionista no criar o próprio Estado nacional era a limpeza étnica de toda a Palestina»14. Esta verdade histórica, demonstrada por fatos e documentos, ainda hoje é sistematicamente negada.

Epílogo

Refletindo afim de chegar a uma conclusão sobre aquilo que foi lido, se pode dizer com toda certeza e sem medo de ser taxado como nazistas ou antissemitas, aquilo que segue.

1º) Aqueles que falam de “limpeza étnica” feita pelos Israelenses nos confrontos dos Palestinenses são um historiador hebreu vivendo atualmente em Israel, Ilan Pappe, que escreveu um livro intitulado precisamente “A limpeza étnica dos Palestinenses” e um historiador jesuíta professor da Pontifícia Universidade Gregoriana, Padre Giovanni Sale, que escreveu na revista La Civiltà Cattolica, que é o orgão oficial da Santa Sé e tem seus rascunhos lidos e corrigidos pela Secretária de Estado vaticana antes de serem publicados. Então, os autores citados são historiadores sérios e profissionalmente qualificados, não são extremistas antissemitas de direita ou de esquerda, mas recolheram fatos, documentos e testemunhos para escrever e provar o que foi escrito acima. 2º) Além disso, em um certo sentido, a Santa Sede finalmente considerou oportuno publicar a verdade, mesmo se “politicamente incorreta”, do genocídio sofrido pelos Palestinenses por parte do neonato Estado de Israel. 3º) A palavra “limpeza étnica” ou “genocídio” pode surpreender se não é aplicada ao povo hebraico como vítima, mas como Estado carrasco, que planificou junto ao Exército israelense a expulsão de um povo e a morte de muitos de seus membros para empossar-se de sua terra. Todavia, Ilan Pappe fornece todas as provas, como fez um outro professor e rabino israelense, Ariel Toaff, para o homícidio ritual pratica pelos hebreus askenaziti contra os cristãos no seu livro Páscoa de sangue (Bologna, Il Mulino, 2007). 4º) Os números deste genocídio sofrido pelos Palestinenses é livremente discutido e pesquisado cientificamente, sem dever isto cair sob a mania de leis liberticidas e “historicidas”, como sucede para a shoah dos hebreus. De fato, os autores palestinenses falam de 1 milhão e meio de vítimas entre os mortos e desalojados, os historiadores “politicamente corretos”, sejam hebreus ou não hebreus, falam de 500 mil vítimas, ou seja, um terço dos dados dos Palestinenses, enquanto os historiadores atuais, mesmo israelenses, que buscam a verdade dos fatos e não o “politicamente correto”, falam de cerca de 800 mil vítimas. Porque, então, nos perguntamos, não é lícito fazer a mesma coisa naquilo que diz respeito a shoah? Fazer história e não “politiquismo-correto” é um crime, um pecado? Infelizmente sim. De fato se termina em prisão (v. Vincent Reynouard) ou “excomungado” (v. Mons. Richard Williamson). 5º) Enfim o nó que permanece e que se não for desfeito levará, muito provavelmente, a guerra nuclear no Oriente Médio é como colocar de acordo Palestinenses e Israelenses. É justo que Israel possua 80% da Palestina e que os Palestinenses sejam confinados na Cisjordânia e no deserto de Gaza, que é um verdadeiro e próprio “campo de concentração”? Se pode invocar a ‘shoah’ para justificar a ‘nakba’? O que os Palestinenses tem haver com os Alemães? Atenção, não é Akhmadineajad a colocar tais problemas, mas um historiador israelense e um jesuíta “pós-conciliar”. Até agora a vulgata exterminacionista da shoah faz água por todas as partes, apenas os politiqueiros e os eclesiásticos carreiristas se obstinam em defendê-la,  et hos devìta” (S. Paolo).

PADRE CURZIO NITOGLIA

10 de fevereiro de 2011

 

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Notas:



1. B. Morris, Due popoli una terra, Milano, Rizzoli, 2008, p. 34.

2. W. Khalidi, All That Remains: The Palestinian Villages Occupied and Depopulated by Israel in 1948, Washington, Institute for Palestine Studies, 1992.

3. Cfr. T. G. Fraser, Il conflitto arabo-israeliano, Bologna, Il Mulino, 2004, p. 44.

4. A. Gresh, Israele, Palestina. La verità di un conflitto, Torino, Einaudi, 2004, p. 75.

5. Cfr. M. Palumbo, The Palestinian Catastrophe, Londra, Quartet Books, 1987, p. 69.

6. Cfr. A. Gresh, cit., p. 77.

7. Jonathan Azaziah (Mask of Zion) citado por “Effedieffe” (24 de janeiro de 2011) escreve que no Iraque em 2003 foram outros 2 milhões de mortos inocentes; hoje mesmo, 9 de fevereiro de 2011, enquanto escrevo, aconteceu um atentado com dezenas de mortos.

8. Na URSS se calcula que foram vários milhões de homícios políticos, segundo Dimitri Volkogonov (Stalin. Trionfo e tragedia, New York, Grove Weidenfeld, 1991) foram 21 milhões de 1929 a 1952. Segundo Robert Conquest (Il Grande Terrore, New York, Oxford, 1990) foram 14 milhões mortos nos gulag’s de 1929 a 1933. Enquanto R. J. Rummerl (Politiche letali: il genocidio sovietico e l’assassinio di massa dal 1917, Transaction, 1990) chega a 60 milhões até 1987. Como se vê os números variam e ninguém arranca os cabelos ou invoca “leis de delito de negacionismo do holocausto hebraico”, como infelizmente fez recentemente o Ministro de Graça e Justiça, o italiano Angelino Alfano.

9. Shoa em hebraico significa “catástrofe” não holocausto, o qual pressupõe uma destruição total da vítima. Ora os hebreus no mundo inteiro, entre Trinda e Quarenta, eram cerca de 30 milhões, dos quais a metade estava na Europa. Então, mesmo segundo a vulgata exterminacionista os seis milhões de mortos não mereceriam, em sentido estreito, o título de “holocausto”. Nakba é a palavra árabe para significar a “catástrofe”; nenhum palestino pretende que a catástrofe do seu povo seja um “holocausto”.

10. Cfr pure Id., Identità palestinese. La costruzione di una moderna coscienza nazionale, Torino, Bollati Boringhieri, 2003.

11. La pulizia etnica della Palestina, Roma, Fazi, 2008.

12. La pulizia etnica della Palestina, Roma, Fazi, 2008, p. 4.

13. Ibidem, p. 108.

14. Ib., p. 9.

 

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