PAULO VI, JOÃO PAULO II E A HERMENÊUTICA DA CONTINUIDADE
d. CURZIO NITOGLIA
- Um ano depois da sua eleição, na sua viagem apostólica ao México realizada a cavalo entre janeiro e fevereiro de 1979, durante a Conferência do Episcopado Latino-americano em Puebla, JOÃO PAULO II falou do Concílio, durante a homília dada em 26 de janeiro na catedral da Cidade do México. Ele sublinhou a importância de estudar os Documentos do Concílio Vaticano II, afirmou que nestes não se encontra “como pretendem alguns uma “nova Igreja”, diferente e oposta a “velha Igreja”. […] Não seria fiel, neste sentido, aqueles que permanecem fiéis aos aspectos acidentais da Igreja, válidos no passado mas hoje superados. Assim como não são nem fiéis, aqueles que em nome de um profetismo pouco iluminado, atirando-se a uma aventurosa e utópica construção de uma “nova Igreja” assim chamada “do futuro”, desencarnada daquela “do presente”(4). Na sua visita pastoral na Bélgica em 18 de Maio de 1985 especifica que alguns “o estudaram [o Concílio] mal , mal interpretado, mal aplicado”, causando “aqui ou lá desordem e divisão (5). No Sínodo extraordinário de novembro-dezembro em 1985 João Paulo II afirmou: “O Concílio deve ser compreendido em continuidade com a grande Tradição da Igreja […]. A Igreja é a mesma em todos os Concílios (Ecclesia ipsa et eadem est in omnibus Conciliis)”(6). Em seu livro entrevista com Vittorio Messori “Cruzando o limiar da esperança” de 1994 (Milão, Mondatori) na página 171 escreve que é preciso “falar do Concílio, para interpretá-lo de modo adequado e defender-lo de interpretações tendenciosas”. Então durante o Julibeu de 2000 retorna ao tema e precisa a necessidade de superar “interpretações tendenciosas e parciais que tinham impedido de exprimir melhor a novidade do magistério conciliar(7). Então explícita que “o ensinamento do Vaticano II, deve ser inserido organicamente no interior do Depósito da fé, e então integrado com o ensinamento dos pontífices e de todos Concílios precedentes”(8).
Dois prelados progressistas “peritos conciliares” em odor de continuidade pós-conciliar
- Cardeal FRANZ KÖNIG já fim de “4 de julho de 1965”(9), durante uma peregrinação a Mariazelli, denunciou “as duas atitudes erradas diante do renovamento da Igreja: aquela daqueles que com o pretexto do renovamente colocavam em perigo a substância mesma do patrimônio da fé, e aquela daqueles que ameaçavam o renovamento da Igreja recusando-se admitir que essa é um organismo vivo que vai se desenvolvendo (ndt.: como um macaco darwiniano), e não uma peça de museu”(10). Mesmo em 1º de setembro de 1966 diante da intempestiva iniciativa litúgica König publicou no jornal diocesano um aviso contra os abusos liturgicos, referindo-se ao Concílio de Trento e a Missa de S. Pio V (cfr. Documentation catholique, nº 63, 1966, pg. 1725-1726). Alguns meses antes em uma conferência (feita sempre em Constância) König tinha comparado o renovamento conciliar ao movimento do mar onde a onda apresenta um fluxo e refluxo, assim a atual fase conciliar da história da Igreja seria sucedida de uma outra fase, a qual – atenção – não anulará a primeira mas a consolidará (11).
- “Monsenhor CARLO COLOMBO se preocupou antes de tudo dos Bispos que pareciam muito angustiados com o perigo de um distanciamento da Tradição, e por isso teria participado de encontros com representantes da ala tradicionalista em sessão conciliar”(12). O que surpreende não é a tática típica dos modernistas de realmente inovar e ao mesmo tempo de afirmar verbalmente que tudo permanece substancialmente como antes, mas é a ingenuidade com a qual, também hoje, alguns “tradi-ecumenistas” o “teo-tradi” acreditam nas boas intenções de Bento XVI no tratamento com os anti-modernistas depois de cinquenta anos de engano e promessas não mantidas. JAN GROOTAES, professor de “Ciência religiosa” da Universidade de Louvânia, informa que a figura de Carlo Colombo era mais discreta, “mesmo esquiva [e] foi pouco conhecida do grande público do Concílio. Essa escondia porém uma fortíssima personalidade, cuja propensão a privacidade andou ulteriormente aumentando quando foi conselheiro e amigo de Mons. Montini quando tornou-se improvisadamente, em 1963, o “teólogo pessoal” – e sob certos aspectos clandestino – de Paulo VI. Um aspecto desta “clandestinidade” consistia, por exemplo, no fato que Mons. CARLO COLOMBO, diferentemente dos conselheiros da Cúria, ser recebido fora das audiências oficiais e sem nenhuma forma de publicidade”(13). A sua teologia era caracterizada por um forte orientamento ecumenista, de uma eclesiologia a colegialidade episcopal, ele era claramente contrário a escola romana e contemplava o norte da Europa, a saber a nouvelle thèologie. Durante o pontificado montiniano tornou-se oficiosamente “centrista” ou “extremista de centro” (J. Grooaters), vale dizer que antecipou a doutrina da hermenêutica da continuidade, que é tão velha quanto Paulo VI.
d. CURZIO NITOGLIA
9 fevereiro 2011
http://www.doncurzionitoglia.com/paolovi_gpii_ermeneutica_continu.htm
(1)] G. Alberigo, Breve storia del Concilio Vaticano II, Bologna, Il Mulino, 2005, p.
(2) G. ALBERIGO, Breve história do Concílio Vaticano II, Bolonha, O moinho, 2005, pg. 148
(3) J. GROOATERS, Os protagonistas do Concílio Vaticano II, Cinisello Balsamo (cidade italiana), São Paulo (editora), 1994
(4) Ensinamento de João Paulo II, II, 1979, (janeiro-junho), Cidade do Vaticano, LEV, pg. 151
(5) “Discurso ao episcopado belga”, 18 de maio 1985, em “O Reino documentado”, Bolonha, Edição Dehoniana, XXX, 1985, pg. 328.
(6) Sínodo extraordinário Ecclesia sub verbo Dei mysteria Christi celebrans pro salute mundi, Relatio finalis, in “Enchiridion Vaticanum”, Bolonha, Ed. Dehoniana, 9, 1983-1985, nr. 1785, pg. 1745
(7) “O Reino documentado”, Bolonha, Ed. Dehoniana, XLV, 2000, pg. 232
(8) “Sínodo da Arquidiocese de Cracóvia em 1972”, citado em G. MICCOLI, Em defesa da fé. A Igreja de João Paulo II e Bento XVI, Milão, Rizzoli, 2007, pg 25. Sobre o Sínodo de Cracóvia em 1972 cfr. B. LECOMTE, João Paulo II, Roma, A biblioteca da República, 2005, pg. 207 ss. E G. WEIGEL Testemunha da esperança. A vida de João Paulo II, Milão, Mondatori, 2005, pg. 252 ss.
(9) Quarenta anos antes do “Discurso de Bento XVI a Cúria” de 22 de dezembro de 2005, que causou tanta surpresa aos conservadores pela sua “originalidade”, mas que é tão velho quanto o Concílio e os expoentes ultra-radicais deste. Onde não se vê qual esperança possa suscitar em ambiente anti-modernista tal teoria da hermenêutica da continuidade.
(10) J. GROOATERS, Os protagonistas do Concílio Vaticano II, Cinisello Balsamo (cidade italiana), São Paulo (editora), 1994, pg. 154. Cfr. Documentation catholique, nº 62, 1965, pg. 1499-1502
(11) J. GROOATERS, cit., pg 155, nota 27.
(12) J GROOATERS, cit. Pg 87, nota5; cfr. L. BETTAZI, Uma presença interessada em opiniões e diálogos, em “Terra ambrosiana”, nº 32, 1991, pg; 17-18.
(13) J.GROOATERS, cit. pg. 85.
(14) A. S., vol. I, cap. 3, pg. 34-35 e 139.
(15) J. RATZINGER – P. SEEWALD, Le sel de la terre, Le christianisme et l’Eglise catholique ou seuil du III millènaire, Parigi, Flammarion-Cerf, 1977, pg 72.
(16) G. ALBERIGO (direto de), História do Concílio Vaticano II. A formação da consciência concliar, outubro 1962-setembro 1963, Bolonha, O Moinho, 1996 vol.II, p. 361.
(17) H. JEDIN, História da minha vida, Brescia, 1987, pg. 314-315; J. RATZINGER, Das Konzil auf dem Weg. Rückblick auf die zweite Sitzungperiode, Köln, 1963-1966 (tr, it. 1965-1967), 4 vol., pg. 9-12 .
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