LA CIVILTÀ CATTOLICA: LIBERDADE DE CONSCIÊNCIA

 

 

 

    P. Francesco Salis Seewis S.J.
 Tradução: Gederson Falcometa
I.

Verdadeira noção de liberdade de consciência.

L’Opinione escrevia sob o título Liberdade de Consciência (n. 220) o que segue: «Lemos no L’Osservatore Romano: – L’Opinione estigmatizando as rigorosas medidas que se dizem adotadas pela Rússia contra os judeus, mesmo com o Times querendo que de toda parte surgissem protestos contra essas perseguições moscovitas. E L’Opinione o queria porque de todas as liberdades, a mais divina e a mais humana a um só tempo é aquela de consciência.

« – Nos permitimos demandar (segue o L’Osservatore Romano): esta liberdade de consciência é a mais divina e a mais humana apenas para os judeus, ou tem um pouquinho também para os católicos? Se sim, porque então aqui em Itália tanta guerra se faz aos católicos e ao catolicismo, e porque por todo o mundo se oprime a liberdade de consciência de trezentos milhões de católicos ao negar ao Papa a sua liberdade efetiva e a sua real independência?» L’Opinione lida com estas palavras assim: «a guerra em Itália contra os católicos é uma invenção do partidarismo político reacionário.» Este breve trato de L’Opinione fornece gravíssimas considerações.

 Antes de tratar do assunto, nós ainda repetimos que de todas as liberdades a liberdade mais divina e a mais humana a um só tempo, é aquela de consciência. Mas sabe L’Opinione e a seita a qual pertence, que coisa seja a liberdade de consciência? Não o acreditamos absolutamente, porque esta seita não sabe que coisa seja consciência. Aprenda em primeiro lugar a significação desta palavra. Consciência é o ultimo ditame ou juízo prático em torno a dever ou poder fazer, ou não fazer uma ação. Então esta consciência intima uma obrigação, ou anuncia uma liberdade de operar. Por exemplo: Tu deves socorrer o teu filho de tal ou tal outra maneira: tú não deve traí-lo: tu podes deixa-lo impune ou não deixa-lo: tu não deve entrega-lo a este mestre, o qual lhe envenenaria a mente e corromperia o coração. De tal forma exprimem aquele ditame que se diz consciência. Em toda ação que se faz com conselho e que é verdadeiramente humana, deve preceder a consciência, tanto nas relações individuais quando nas civis e politicas.

Exceto que o conceito de obrigação não pode ter lugar sem aquele dos dois termos realmente distintos, os quais são o obrigante e o obrigado, e o obrigante em quanto tal, é essencialmente superior ao obrigado. Aonde ninguém pode obrigar a si mesmo, nem quem é a si superior: e porque todo homem considerado na sua dignidade natural é igual a outro homem, de nenhum homem pode derivar frontalmente aquele imperativo, com o qual se intime a outro homem tu deves fazer ou deves não fazer esta coisa ou você é livre a fazê-la ou não fazê-la. Quem é por natureza superior ao homem é Deus, e apenas a razão de Deus é regra da razão do homem, e a vontade de Deus é regra daquela do homem. Para qual coisa Deus dando a razão humana à luz, onde conhece o verdadeiro e julga retamente, amestra suas vontades e por meio da própria razão humana o obriga a fazer aquilo que quer. Quando, porém entra o homem, se diz devo fazer isto, outra coisa não faz que repetir o império interno de Deus com o qual ele diz tu deves fazer isto.

Se Deus imediatamente revelasse aos homens os seus mandamentos, bastaria conhecer com certeza o fato desta revelação, para que a consciência não fosse errônea. Enquanto Deus não podendo errar nem enganar, seria certa a obrigação de fazer aquilo que Deus manda. Mas o homem com o uso da própria razão deve chegar ao conhecimento da verdade e da vontade de Deus, às vezes pode cometer erros e fazer que este ultimo juízo prática que é a consciência, seja errôneo. O qual erro às vezes pode ser involuntário e invencível nas circunstâncias na qual se encontra a pessoa errante, e em tal caso ele pode sem culpa segui-lo; e deve mesmo: mas pode às vezes ser um erro culpável; e é tal, quando a pessoa temerariamente, julga sem nenhum sólido fundamento de verdade, e diz dever fazer aquilo que em realidade com a mente vê não dever fazer, mas vê antes o dever de fazer o contrário. Em tal caso essa deve depor o erro e não segui-lo. Sempre então quando aquele juízo ultimo é falso, não é verdadeira mas falsa consciência; e porque tal, não é propriamente consciência, como o ouro falso não é ouro.

 

II.

A consciência dos liberais.

No sentido sectário, agora comum, tomamos esta palavra liberal. Eles são os únicos, que admitem a assim dita liberdade de pensamento junto com a liberdade consciência. Senise Prefeito de Bari, o qual foi encomendado por Crispi no Parlamento do dia 28 do passado agosto, em um Congresso de professores elementares, entre outras estultícias disse ainda esta: que «o Governo invoca, aclama a ciência como aliada no renovamento civil, destruindo a superstição, e alçando o monumento a Giordano Bruno em Campo dei fiore na Capital, onde foi destruído o Papado temporal e a tirania da consciência, obtendo o triunfo do livre pensamento, e o triunfo da ciência.» Isso vem referido pela Reforma.

Mas sabeis vós que aqueles que professassem na prática esta teoria, não seriam certamente dignos dos presídios e dos manicômios da pátria? A fortuna é que muitíssimos deles que professam tal liberalismo, falam como papagaios, sem entender aquilo que dizem.

Cuide-se bem das vossas palavras e aquela iníqua e estulta significação que se da a essas nas escolas liberais de professores imbecis, a liberdade de pensamento é excluir aquela que vós chamastes superstição, isto é excluir da razão humana o conceito de Deus e do vínculo de uma obrigação divina, e a firmeza de imutáveis princípios no filosofar; de tal modo que qualquer um se dê a filosofar como os mais talentosos. Mas senhores, o excluir da mente Deus e a divina obrigação é destruir a consciência, e então, a coisa é toda outra que reconhecer a liberdade. A razão humana não cria a obrigação de operar, mas a descobre; não cria a verdade, mas a aprende e a ela se conforma. O filósofo não é poeta que inventa; mas é pintor que fielmente copia a natureza. A vossa liberdade é um sonho, é um delírio. Mas não nos delonguemos com o discurso fora da consciência.

A consciência, como dizíamos, é um último juízo prático em torno da obrigação de fazer ou de não fazer uma coisa. Prescindindo-se de Deus obrigante, porque superior e porque dono de todo o homem, a obrigação é impossível, e si deverá cair ou na tirania que o homem possa por si mesmo obrigar outro homem seu igual, ou na loucura que o homem obrigue a si mesmo. Então, o liberalismo que exclui Deus, exclui o conceito verdadeiro de consciência, e é um absurdo dizer comL’Opinione que a liberdade de consciência é a mais divina e mais humana entre as liberdades.

Mas se nos dirá, vós andais em filosóficas sutilezas. Por consciência nós entendemos uma interna persuasão de dever operar ou não operar ou de ser livre para operar, sem algum respeito a Deus. Egregiamente! Então, vós direis que a liberdade de operar segundo tal persuasão é a mais divina e humana das liberdades? Encarnamos a vossa doutrina em fatos evangélicos e em fatos históricos dos nossos tempos.

Herodiades adúltera concubina de Herodes tendia a insidiar São João Batista, porque este dizia a Herodes não lhe ser lícito ter por mulher a mulher do seu irmão. Recorramos a passagem do Evangelho (Marcos 6) «Pois Herodes respeitava João, sabendo que era um homem justo e santo; protegia-o e, quando o ouvia, sentia-se embaraçado. Mas, mesmo assim, de boa mente o ouvia. Chegou, porém, um dia favorável em que Herodes, por ocasião do seu natalício, deu um banquete aos grandes de sua corte, aos seus oficiais e aos principais da Galileia. A filha de Herodíades apresentou-se e pôs-se a dançar, com grande satisfação de Herodes e dos seus convivas. Disse o rei à moça: Pede-me o que quiseres, e eu te darei. E jurou-lhe: Tudo o que me pedires te darei, ainda que seja a metade do meu reino. Ela saiu e perguntou à sua mãe: Que hei de pedir? E a mãe respondeu: A cabeça de João Batista.
Tornando logo a entrar apressadamente à presença do rei, exprimiu-lhe seu desejo: Quero que sem demora me dês a cabeça de João Batista. O rei entristeceu-se; todavia, por causa da sua promessa e dos convivas, não quis recusar. Sem tardar, enviou um carrasco com a ordem de trazer a cabeça de João. Ele foi, decapitou João no cárcere, trouxe a sua cabeça num prato e a deu à moça, e esta a entregou à sua mãe.» Ó tirano orgulhoso! Embora Herodes em sua mente se persuadisse a dever fazer aquilo que fez, ansiando o juramento e o respeito aos convidados. Esta persuasão estava na consciência dele? Se discorrermos segundo a teoria do liberalismo que prescinde de Deus e admite a liberdade de pensamento, devemos dizer que foi, e Herodes gozava nisto da liberdade mais divina e humana. Mas esta sua persuasão era um juízo prático derivado de um juízo verdadeiro da existência de uma obrigação ou ao menos licença de fazer aquilo que fez? O seu erro era invencível? Poderia ele estar de boa fé? Na teoria dos nossos adversários, Herodes tinha o direito de fazer aquele ato e devia gozar de pleníssima liberdade de fazê-lo.

Da mesma maneira um que entende assassinar um imperador ou um rei ou golpear com uma pedra um ministro de Estado, porque esta persuadido de fazer algo para si e para os outros gratos sectários, e jurou, ele de acordo com a teoria da liberdade de pensamento e aquela de consciência, querer ser respeitado nem fará coisa culpável diante da sociedade, já que a liberdade de consciência é a primeira liberdade de todas as outras e a mais divina e a mais humana.

Portanto, a doutrina que deriva dos princípios da seita liberal é uma doutrina que dá impunidade a todos os delitos e é a doutrina que justifica o regicídio, e da qual consegue até mesmo que não mereçam punição os delitos políticos quaisquer que sejam. E os ladrões, os assassinos, os adúlteros, toda flor de vilões na liberdade de pensamento e de consciência terão justificação para os seus crimes.

III.

No sentido liberalesco não existe lei, mas apenas legalidade.

Portanto se este último juízo prático que é a consciência, com a qual o homem se determina a operar, não é deduzido de uma lei ou imperativo ou proibitivo ou permissivo, não tem o caráter de consciência nem merece por si respeito e não tem direito a liberdade. Isto é verdadeiro para cada um dos homens em particular, para os Governos, para os parlamentos e para o rei.  Enquanto nenhuma ordenação parlamentar ou real tem virtude obrigatória, nem deve ser reconhecida como norma das operações humanas, se não tem por base a autoridade divina. Por isso, ao mesmo tempo é blasfemo e tirânico aquilo que é dito e que as vezes ressoa na aula parlamentar; toda norma de obrigação vem apenas desta aula: afirmando-se queapenas a vontade dos legisladores constituí a norma da justiça e do dever. Uma lei que seja certamente contrária a lei de Deus, poderá revestir-se de todas as formas extrínsecas da legalidade, mas na realidade não será lei, nem será norma de obrigação da consciência, nem produzirá nos súditos dever ou liberdade. Quando não se tem como inabalável esta doutrina, será preciso conceder que todas as ordenações dos tiranos de Roma, do Diretório e da Convenção de França, foram verdadeiramente leis, coisa absurda e nefanda. Assim foram, são e serão iníquas ordenações e não verdadeiras leis, aquelas com as quais se interditava aos cristãos de professar o verdadeiro culto de Deus e de seguir os divinos preceitos. E em verdade, em direito é nula a autoridade dos homens, ainda que sejam reis ou imperadores, quando se opõe a divina autoridade.

Aquela sentença “omnis potestas a Deo est”, é filosoficamente, diante da razão, evidente e é, em fé, certíssima: não pode vir de Deus aquilo que a razão divina e a sua vontade se opõe.

Por essa razão os Governos constitucionais modernos que se declaram ateus, por isso mesmo, se declaram não ter nenhuma autoridade para fazer leis. Tais Governos são plantas que tem a raiz envenenada, e considerados em si mesmos são tirânicos e merecem não subsistir. Querendo ter em si mesmos o gérmen da corruptibilidade, ainda que brevemente, por conta das paixões populares, duradouras e antes de tudo aos insipientes pareça ter vida estável, logo se decompõem e não deixam depois de si que execração e uma história vituperiosa.

 

IV.

Liberdade de consciência com relação a religião.

Seja então firme que a liberdade de consciência é o direito que tem o homem de não ser impedido por nenhum outro no fazer aquilo que lhe é prescrito pela lei divina e no não fazer aquilo que lhe é vetado. Quando dizemos lei divina, não entendemos excluir a lei humana, seja religiosa, seja civil, porque a lei humana da divina recebe toda a sua força, e Deus prescreve obediência aos superiores que tem o poder de fazer leis e dar preceitos na ordem religiosa ou na ordem civil. Por isso o homem é obrigado por Deus e em consciência a fazer aquilo que prescreve e a não fazer aquilo que veta a razão humana, se não é contrária a lei divina. Esta limitação é certíssima, já que não nos pode ser lei humana se é contrária a lei de Deus, embora tenha as formalidades extrínsecas da lei. Colocado isto, entramos a discorrer a respeito da liberdade de consciência na religião no campo social.

É evidente que existe apenas um Deus, como a própria razão demonstra com provas invencíveis. E esta demonstra também com evidentes certezas que Deus pode revelar as suas criaturas racionais verdades e preceitos, ou seja, pode revelar uma religião e o modo com o qual nessa quer ser honrado; e finalmente, a razão demonstra com aqueles que são chamados motivos de credibilidade, o fato da existência desta religião revelada. Além disso, é também certo que da unidade de Deus segue a unidade da verdadeira religião e que religiões contrárias não podem ser verdadeiras. A religião verdadeira não pode ser outra que aquela querida por Deus; e esta é a cristã: por isso não será verdadeira nem a judaica, nem a maometana, nem a idolátrica, as quais também ante a razão humana apresentam o caráter da sua falsidade. Em seguida consta na história que a religião cismática e as protestantes não são outra coisa que ramos desenraizados da grande árvore da Igreja Romana, a qual tem a sua base incrolável em São Pedro, enquanto estas outras religiões são consignadas as recentes origens, formadas com evidentes rebeliões ilegítimas a Romana.

Ora, a liberdade de consciência na realidade, não se pode ter naquilo que é contra a lei divina: portanto nenhuma falsa religião pode reivindicar verdadeiro direito de liberdade de consciência.

Por isso o princípio liberalesco da igualdade de todas as religiões é absurdo, nem em virtude deste princípio pode existir por si liberdade de consciência para as falsas religiões. Dizemos por si, já que a consciência de quem quer operar segundo os ditames de uma falsa religião se fundaria no erro, e a consciência é juízo prático verdadeiro que deriva da lei divina conhecida. Todavia quem esta em uma falsa religião pode ter ignorância invencível e não culpável, e de fato muitos podem encontrar-se em tal condição. Isto pode verificar-se naquelas religiões que não manifestam em si mesmas evidentemente o caráter de absurdidade ou de imoralidade, como o apresentam, a título de exemplo, a maometana e as idolátricas. Em tal caso quer-se ter respeito aos indivíduos que estão nestas religiões falsas, e não usar a violência para lhes constringir a abraçar a verdadeira religião, já que não é licito constringir a nenhum a fazer aquilo que ele acredita ímpio, quando esta crença derive de uma ignorância invencível.

Jesus Cristo quis que a sua religião divina se difundisse com a pregação selada pelos milagres e não com a espada. E assim foi difundida e continua a difundir-se por toda a terra. Os Apóstolos e os seus sucessores tem seguido o preceito de Jesus Cristo pregando o Evangelho e os deveres do cristão, inumando a sanção da vida ou da morte eterna; nem requerendo o crer com a ameaça do cárcere ou da morte presente. Este modo violento utilizaram os inimigos do Cristianismo, que arrastavam os cristãos ante as estátuas de Júpiter e Vênus e, se não queimassem o incenso as imundas e insensatas divindades, lhes cortava a cabeça ou de outra forma os martirizavam. E os heróis cristãos, para obedecer a Deus e cumprir o dever da sua consciência, se deixavam matar com plena liberdade; e lhe temos exemplos, não as centenas ou aos milhares, mas aos milhões. Mas quando se trata de ímpios, que renegando a fé se empregavam a arrastar outros para a ruína e cometiam delitos sociais, é bem diversa a questão.; e porém a potestade eclesiástica teve o direito não só de fazer  pesar sobre eles as penas espirituais, mas também de entregar-lhes ao braço secular e deixar que a potestade civil lhes punisse com aquelas penas que dessa tinha o direito de infligir aos perturbadores da ordem pública. Então da história aprendemos que às vezes o imperador e o rei puniram com penas gravíssimas os apóstatas e heréticos quando eram juridicamente pela autoridade eclesiástica, reconhecidos como tais. Isto foi por eles considerado como um meio útil e necessário para impedir sumos males na sociedade, ameaçada pelos princípios e pelas ações daqueles. Esta foi a origem da famosa Inquisição que salvou até mesmo politicamente a França e a Espanha, as quais de outro modo, por obra dos maniqueus e dos judeus ou outros heterodoxos, estariam perdidas.

Os Papas toleraram em Roma a presença dos judeus e de tantos protestantes que sempre a ele acorreram. Na verdade os judeus, pela boca do grande sinédrio israelítico cosmopolita, convocado nos tempos de Napoleão I em Paris, professaram gratidão aos Pontífices Romanos e ao Episcopado Católico, porque utilizaram com esses, grande humanidade e muitas vezes tomaram as suas defesas contra o furor dos cristãos armados para o seu dano, e não sem razão. E podemos com verdade afirmar que os Papas continham no dever os princípios cristãos, afim de que o exercício do seu poder não degenerasse jamais em um zelo excessivo, constringindo com violência a reduzir os infiéis a fé de Cristo, mas utilizassem mais aqueles meios que estão indicados no Evangelho e esses a Igreja praticasse.

 

V.

Violação da liberdade de consciência nas nações cristãs.

Quando se trata de um povo cristão e de um Governo cristão, o qual tem o dever de reger cristãmente aquele mesmo povo, é absurdo pretender a liberdade de consciência para criar leis, que ofendam a religião cristã, com a finalidade de favorecer aqueles que são de religiões diversas ou que não tem religião nenhuma. No entanto, este erro fatal e este deplorável fato se encontra naqueles Governos liberais ou maçônicos da sociedade modernizada, a respeito dos súditos que tem o mesmo direito de serem governados cristãmente. Nestes Governos se renova continuamente o fato de Pilatos. Em torno ao seu tribunal estavam reunidos aqueles que no peito ebulia a inveja mortal contra Jesus: Sciebat quod per invidiam tradidissent eum. (Matt. c. 27). As facções dos escribas e dos fariseus não queriam a sua morte. Pilatos, considerando os fatos a luz da razão, não encontrava nada digno de condenação em Cristo, non invenio in eo causam. Mas eles se enfureciam gritando: Nos legem habemus et secundum legem debet mori; e depois instavam Pilatos sobre no campo da política: Si hunc dimittis, non es amicus Caesaris. A razão de Estado requer que tu o mandes a morte de cruz, dando a liberdade e a vida a Barrabás, infame assassino. Assim, se formou em Pilatos a consciência de dever satisfazer os desejos dos iníquos e assim a segue.

Entramos agora na aula parlamentar de um Governo modernizado em uma nação cristã e católica, o qual Governo deveria também não apenas respeitar a religião, mas jamais contradizer as suas leis em força de um Estatuto jurídico. Existe neste Parlamento uma facção de homens que colocando sob os pés a verdadeira ciência, pretendem falar em nome de uma ciência que pisoteia os primeiros princípios da razão e do bom senso. Existe outra seita de fariseus que com vil hipocrisia em nome da moral se diz cultora do livre pensamento. E existe a seita maçônica que as duas primeiras abraça e que jurou guerra contra Deus e ao seu filho Jesus Cristo, e tende com todo meio culpável a ruína dos povos.

Estas seitas gritam no Parlamento: morte a Cristo na sua religião, no seu Vigário, nos seus sacerdotes. Se torne desconhecido os seus direitos, se negue sua liberdade, se congestione as suas ações, se cancele Deus da educação e da família. Aos cultores de Jesus Cristo se negue aqueles direitos sociais, que tem todos os cidadãos até mesmo os judeus, se os persiga sempre e em toda parte. Os sectários deputados não trazem provas ou testemunhas de fatos rei; tudo se reduz a gritos e ameaças, e não se repete outra coisa no Governo que si nunc dimitis, non es amicus Caesaris. Se reconhecem os direitos do Vigário de Jesus Cristo, do Episcopado, do clero, do laicato católico, da doutrina e da moral católica, não és amigo da ciência moderna, do progresso, da liberdade moderna, da liberdade popular e da liberdade de pensamento. Aos gritos intemperantes da opinião pública, os quais não podem na realidade representar a nação católica e o próprio Governo, concede Cristo a vontade deles, e aceita leis opostas as leis de Jesus Cristo contra o clero e contra o laicato católico.

Assim é violada a liberdade de consciência em todas as nações católicas, e estas violações sancionadas com leis tuteladas pela força pública.

Este espetáculo de um povo que é tirada a liberdade de consciência o vemos diante aos olhos de vários ilustres na Itália, onde o caráter de verdadeiro católico é considerado a guisa de uma nota de infâmia sobre a fronte de todo cidadão. O qual se mostra sinceramente, tal, não tem acesso aos empregos públicos, e se porventura lhe tem acesso, lhe vem desonerado, maltratado e enfim expulso. Assim, quando um município se mostrasse sinceramente católico, contanto que não fosse o município de um vilarejo sem nome e de nenhuma conta, vem escolhido e se ordenam tramas, enganos, calúnias, violências, afim de que um novo município liberal e maçônico venha a ser eleito.

E, todavia L’Opinione tem a estúpida simplicidade de dizer, que a violação da liberdade de consciência na Itália é invenção dos reacionários, embora seja uma realidade na Rússia que ameaça promulgar severas leis contra os judeus e assim viola neste a liberdade de consciência. Não defendemos a Rússia muito intolerante e despótica. Mas a Rússia não fez e nem esta disposta a fazer alguma lei que vete aos judeus o culto do Deus de Abraão, ou que proíba as suas leis e os seus ritos ou destrua as sinagogas. A Rússia considera o povo judaico como um povo essencialmente errante, não nacional, que suga o sangue dos nacionais e, com a usura e a fraude, roubam as riquezas dos privados e do público; o considera um povo estrangeiro que dá o maior contingente a sanguinária seita niilista, a qual tramou e trama a matança dos imperadores e dos governantes. Na Itália, o povo católico, ao qual a liberdade de consciência é em realidade violada, não é povo de ladrões, ou de sectários, não é estrangeiro, mas é aquele povo que constituí a própria nação; é aquele povo ao qual o Rei jurou um Estatuto que é o fundamento da sociedade de direito, a qual Estatuto também prestou juramento os membros do Governo e todo parlamento. O primeiro artigo deste Estatuto é o reconhecimento da religião católica, como religião do Estado. Este Estatuto é desconhecido por um governo que nega na realidade ao povo a liberdade de consciência e se torna por isso, o tirano da nação. Cego, não considera que o Soberano pode dilacerar um Estatuto que é violado, e que a nação pode encontrar razão de não reconhecer a dinastia a qual se submete sobre a base desse Estatuto.

Em consequência dos seus princípios liberalescos, a Perseverançade Milão, concede a Roma e a Itália o direito de fazer revolução, já que a respeito do Cantão Ticino profere esta sentença (16 de Setembro de 1890). «A causa imediata da revolução ticinense conta bem pouco, perto daquela grande causa que se resume na palavra: quinze anos de Governo conservador-clerical sem respeito para os adversários políticos.» Agora os católicos que estão sob a obediência do Papa, (e os católicos se são verdadeiramente tais, devem estar sob a obediência do Papa, o foram e sempre o serão) estão a vinte anos em Roma e a trinta no resto da Itália considerados como adversários políticos do Governo italiano que se declara ateu, o qual Governo para esses foi sem respeito. A consequência é clara! Mas os atentados ao regicídio, as pedras contra os ministros de Estado, os tumultos, as conjurações não veem dos fiéis católicos, mas das filas daqueles que se rebelam contra os princípios da religião, inculcada por aqueles Padres e por aquelas religiosas que o Governo anticatólico suprime, espolia, calúnia, blasfema quase dignos de todo suplicio. Estes virtuosos cidadãos não alçaram jamais a bandeira da revolta, contra aqueles que violam a liberdade de consciência, como não a alçaram os primeiros cristãos contra Nero, os Dioclecianos, e nem sequer contra o apóstata Juliano. A revolução vem trabalhada pelos inimigos dos católicos, vem ocasionada pelo próprio Governo, para que como disse Cristo regnum in seipso divisum desolabitur. A Igreja Católica é imortal, porque é una e não divisa; e Jesus Cristo assegurando-lhe a imortalidade, assegurou-lhe perpétua unidade. A nossa desgraçada pátria não é dividida mais em sete Estados, mas é dividida em mil farrapos, quantos são os partidos e as facções que entre eles se opõem e a corrompem do interior e a tornam débil ao exterior, contra forças que atentassem para a sua destruição.

Esta Itália legal é similar ao homem suicida, que disparando um revólver no coração, caça por sua própria vontade por si mesmo, o princípio da vida. Essa dilacerando o Estatuto que quer a religião católica, a religião do Estado, se mata a si mesma.

O Governo da Itália considerado parece agora tão sem sentido, que faz desesperar dele: vai de precipício em precipício, nem mostra que compreende, ou melhor, se percebe despreza e ri. Os sapientes e os sinceros amadores da pátria desprovidos de todo arranjo para salvá-la, outra coisa não podem fazer que, chorar aquele riso, aquele desprezo e a consequente ruína.

É então extremamente estranho, que o Governo pretenda que o povo italiano católico se mostre satisfeito pelo seu regimento, reconhecente de seus benefícios e jamais mova lamento pela violada liberdade de consciência. O único reconhecimento que se lhe pode demonstrar, é aquele de um assaltado para o ladrão, que se contentou em depredá-lo  e bater-lhe, sem ainda tirar lhe a vida. Vós continuamente por meio dos vossos órgãos, que são as folhas mentirosas liberais, vilanizam os católicos nas suas crenças; dizem sempre que o seu culto, que é aquele da Nação, é uma superstição medieval merecedora de desaparecer ante a luz do progresso moderno. Vós de um lado tratais por ignorante os eclesiásticos de grande valor, porque cumprem os deveres sagrados da sua missão divina, e por outro lado se qualquer miserável que tenha renegado com a fé a dignidade sacerdotal e todo bom senso em fato de doutrina, o tratais como homem insigne e o promoveis a conspícuos postos na instituição pública. Vós haveis retirado às posses de todas as virgens consagradas a Deus e lhes deram seus poucos centavos a título de pensão, também tornaram dificultoso haver-lhes e as constringiram quase a morrer de fome; enquanto as concubinas e as meretrizes são defendidas, reverenciadas e giram como matronas em nobres carruagens pela cidade. Vós sois sempre parasitas a tornar vã com a violência ou com a astúcia o acesso às urnas aos católicos supondo que vos tomam; e onde também porventura conseguissem mandar as câmaras uma notável representação a fazer pesar os seus justíssimos votos, teríamos certeza moral que vós em virtude dos vossos princípios liberalescos usariam aqueles meios que utilizaram os liberais do Cantão Ticino, onde a morte de Rossi no palácio do governo de Bellinzona foi uma cópia do assassinato de outro Rossi cometido na Chancelaria de Roma. Penhorado lhe seja, o universal aplauso conferido nos jornais liberais da Itália, acima dos gestos facínoras dos anticlericais ticinenses, e das mentiras contra aquele Governo legítimo e honesto que foi vítima dos traidores.

 

VI.

Vãs e absurdas pretensões.

Então não é de admirar que desta maravilha indizível a seita maçônica e liberal, estendeu qual polvo gigante os seus tentáculos em toda Itália, ao mesmo tempo em que por meios dos jornais às vezes diz querer reconciliar-se com o Papa, claramente afirma duas coisas. Uma qual condição essencial que é o Papa renunciar a soberania; uma essencialíssima, que o sistema de governo italiano deva sempre propugnar leis que sancionem a violação da liberdade de consciência. Bem nos lembra de que quando, algum tempo atrás, o Papa Leão XIII manifestou ardente desejo de que a Itália legal se inclinasse a procurar uma reconciliação com a Santa Sé, mercê da qual haveria assegurado a nossa pátria a paz e a prosperidade; no parlamento o primeiro ministro afirmou que tal conciliação seria danosa a Itália, porque se deveria modificar a legislação italiana. O que evidentemente outra coisa não poderia significar que deveria se colocar em pleno vigor o primeiro artigo do Estatuto, jurado pelo Rei, dando aos católicos verdadeira e plena liberdade de consciência. As quais intenções da facção anticlerical, para outro em realidade não teriam conduzido, que a prepotência e a uma continua guerra contra a Igreja e os católicos. E não são sem cérebro aqueles que se maravilham de que o próprio Papa sempre responde com um non possumus! Pode ele sancionar com a sua autoridade uma condição política, para a qual na Igreja de Pedro que é a Romana e que é a verdadeira Igreja de Jesus Cristo, onde não exista a liberdade de professar à lei de Cristo, os preceitos de Jesus Cristo, a perfeição evangélica e na qual por lei se viole a liberdade dos verdadeiros sequazes de Jesus Cristo? Os Papas podem em verdade tolerar as perseguições, mas o sancionar com a própria autoridade tais perseguições contra a Igreja e as violações da liberdade de consciência católica, isto não foi, nem será jamais.

Deste princípio segue ainda uma conclusão contra aqueles, os quais vão vaticinando um tempo não remoto, no qual a seita triunfe e cesse de existir a Igreja Romana. Enquanto é indubitável que Jesus Cristo prometeu eterna estabilidade a sua Igreja. Ele predisse a mesma, combates e perseguições, mas juntamente lhe assegurou que o inferno não prevaleceria contra ela. Ora, no fato da Igreja Romana de Pedro ser a Igreja de Jesus Cristo, e as outras pertencendo a Igreja de Jesus Cristo enquanto pertencentes a Igreja Romana. Então a Igreja Romana, isto é o pastor Romano com sua própria grei gozará da perpétua estabilidade.   O estado violento ao qual é sujeito a Igreja dura por um longo tempo; mas não por tanto tempo, quanto durou o estado violento nos primeiros séculos da Igreja, nos quais pela remoção da liberdade de consciência foram feitos mártires gloriosos milhões de cristãos. A ponte Mílvio vem Constantino com a bandeira na qual existia uma cruz e as palavras in hoc signo vinces; e os tiranos foram apagados e a cruz foi erigida a bandeira de paz e de caridade em cima do Capitólio. Ora, por vinte anos aquela cruz foi dilacerada, e do mundo cristão vem dissipada a verdadeira paz e a caridade. Sem dúvida nenhuma, por outra mão a mesma cruz será realçada lá em cima. A Igreja Romana, que é eterna, como pode esperar quatro lustres, assim pode esperar-lhe cinco ou ainda dez. Deus não quer que o homem determine os limites do tempo no operar da sua misericórdia e da sua justiça. Mas sílaba de Deus não se cancela: e é certo que aqueles, que  serão tragados pelos turbilhões do Tibre, não será um Constantino.

La Civiltà Cattolica, anno XLI, serie XIV, vol. VIII (fasc. 968, 8 de outubro de 1890) Roma 1890 pag. 167-182.

 

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