D. ALBERTO SECCHI: A HERMENÊUTICA IMPEDE O JUÍZO



Editorial de Radicati nella fede
Padre Alberto Secchi
Tradução: Gederson Falcometa
Vivemos há muitas e muitas décadas em um tempo de reforma perene da Igreja. 

Não sabemos mais nem mesmo como definir a Igreja, se não dentro de uma contínua e extenuante mudança: “quem pára se perdeu” parece ter se tornado ironicamente o novo e onicompreensivo mandamento.

Uma reforma a todos os níveis e sob todos os aspectos foi invocada e atuada para que, diziam, a Igreja pudesse entrar em contato com a sociedade dos homens em perene mudança; para que pudesse entrar em contato com essa de modo mais livre e puro.

A reforma foi requerida e depois propagada por motivos pastorais, para que a Igreja não continuasse a marginar-se em uma recusa da modernidade.

É dentro desta urgência prático-pastoral que a maioria se convenceu da necessidade de aceitar toda uma série de reformas-revoluções que, a partir da Missa, deveriam mudar completamente o rosto da Igreja de dois milênios.

Não é verdadeiro que as reformas, estas reformas, fossem esperadas. O mundo católico sempre teve uma “santa preguiça” em não mudar muito e por séculos a imutabilidade foi ensinada como uma das mais importantes características da verdadeira Igreja.

Mas era necessário não perder o mundo que estava se tornando liberal, agnóstico e depois socialista; era necessário além disso não perder os “irmãos separados” que, no momento, separados por séculos de Roma muito conservadora, tinham produzido com toda liberdade uma série de reformas que talvez, ao menos em parte, podem ser recebidas e valorizadas.

Ocorria mudar, mudar… era o mantra obsessivamente repetido em muitos lugares tanto que também os “devotos” não encontraram mais as razões e a força para dizer não àquilo que subitamente apareceu como a destruição geral da vida católica.

O mundo laico ficou espantado e maravilhado, aclamou a nova igreja que finalmente entrava a fazer parte do mundo das revoluções.

Assim os Padres, alguns chorando, fadigando e confundindo muitos, pouco felizes, mudaram a Missa de sua ordenação, a Missa dos padres de toda a cristandade, e deram início a nova e jamais vista aventura da fundação de um novo tido de cristianismo. Tudo isto foi feito em nome do diálogo com o mundo, que devia finalmente encontrar uma igreja de face humana. Talvez porque a Igreja de um tempo atrás não tinha tido esta face humana? Os santos dos séculos não tinham tido um rosto humano? As nossas simples comunidades paroquiais , aquelas das grandes cidades e aquelas dos aldeias agrícolas ou de montanha, talvez, não tinham sido famílias humanas? Certo que eram humanas, de fato muito humanas… e agora muitos começam a se arrepender desta humanidade! Mas tudo isto não bastava aos costumeiros irrequietos pela evolução social.

Era preciso aceitar mudar para ajudar o mundo a encontrar Cristo, assim diziam os devotos promotores da reforma… assim foi dito, só que em nome do encontro com o mundo a Igreja acabou por se envergonhar de Cristo.
“O humanismo laico e profano apareceu, finalmente, em toda a sua terrível estatura, e por assim dizer desafiou o Concílio para a luta. A religião, que é o culto de Deus que quis ser homem, e a religião — porque o é — que é o culto do homem que quer ser Deus, encontraram-se. Que aconteceu? Combate, luta, anátema? Tudo isto poderia ter-se dado, mas de facto não se deu. Aquela antiga história do bom samaritano foi exemplo e norma segundo os quais se orientou o nosso Concílio. Com efeito, um imenso amor para com os homens penetrou totalmente o Concílio. A descoberta e a consideração renovada das necessidades humanas — que são tanto mais molestas quanto mais se levanta o filho desta terra — absorveram toda a atenção deste Concílio. Vós, humanistas do nosso tempo, que negais as verdades transcendentes, dai ao Concílio ao menos este louvor e reconhecei este nosso humanismo novo: também nós —  e nós mais do que ninguém somos cultores do homem. Paulo VI, 7.12.1965
este foi o programa, mais intelectual que real… mas agora, a cinquenta anos de distância, temos o dever de avaliar os êxitos desastrosos!


Podemos pedir aos pastores da Igreja que considerem o clima de morte reinante no mundo católico? Heresia, banalidade herética, imoralidade sistemática, extinção de todo entusiasmo, clero católico em via de extinção, laicização agnóstica do laicato católico, aborto normalizado, eutanásia praticada de fato, união contra a natureza de fato abençoadas por uma Igreja que cala, desaparecimento do matrimônio cristão, queda de natalidade assustadora, todo gênero de vício admitido e compreendido em nome de um humanismo reencontrado: eram estes os êxitos esperados pelos “cultores do homem”?

Podemos pedir aos legítimos pastores para olharem a realidade e darem uma palavra que não seja o cuidado por uma igreja entendida como uma empresa a ser gerida?

Parece que ouvimos as respostas de alguns deles, os mais “empenhados”: “é muito cedo para julgar um fenômeno tão complexo e recente”.
Sim, é a nova saída para subtrair-se a uma verificação, que no caso da nova igreja acabaria por ser sem dúvida impiedosa.

Fazem assim os pastores modernos, similares aos agentes de cambio nos seus ofícios, mais políticos que crentes, dizem que não se pode ainda dar um juízo, porque devem passar séculos para uma verificação séria! No entanto, os cristãos morrem.

Os cristãos morrem, enquanto os pastores estão preocupados pela unidade da diocese, isto quer dizer que todos digam sim…. mas sim a que coisa, se não ao nada, visto que Cristo naquilo que pedem ou não se encontra ou se perdeu em mil meditações?

Se obstinaram os inovadores, que não amavam mais a Igreja como era porque não entendiam mais Cristo e a sua Graça – não entendiam e se entediavam da vida católica – se obstinaram a pretender a mudança e convenceram os tímidos “devotos”.

Agora eles mesmos inventaram a hermenêutica eclesialmente entendida, para subtraírem-se ao juízo, àquele juízo que é a característica do cristão: “O homem espiritual julga todas as coisas e não é julgado por ninguém” (I Cor 2,15)

Cavalgaram a hermenêutica e lhe deram ares eclesiais: “é a distância que cria significado…” …para interpretar a reforma da Igreja é preciso esperar séculos, só agora começamos a entender Lutero, dizem com descaramento!

Ao invés disso nós pedimos um juízo súbito, que parta da realidade, que parta de Cristo. Devemos pretender a verificação, sem esperar séculos porque, se somos cultores do homem, sabemos que o homem vive apenas de Cristo.

Devemos pretendê-la tudo isto para que as almas vivam da Graça e a Igreja torne a sua face divina, isto é humano.

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